Parecer do relator, ministro Dias Toffoli, defende que informações só podem ser compartilhadas com outros órgãos após autorização judicial
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, adiou para esta quinta-feira (21) a discussão sobre a autorização do uso de dados de órgãos como a Unidade de Inteligência Financeira (UIF, antigo Coaf) em investigações.
O ministro, que também é o relator do caso, foi o único a anunciar seu (longo) voto, no qual argumentou ser necessário autorização judicial para o compartilhamento dessas informações sigilosas com outros órgãos. “E sua disseminação deve ser feita exclusivamente por seus sistemas eletrônicos, certificados com registro de acesso. Fica vedada assim a entrega por qualquer outro meio”, defendeu.
Na quinta, o primeiro a ter a palavra será o ministro Alexandre de Moraes.
Em julho, Toffoli abriu esse debate ao determinar a suspensão de todas as investigações que utilizavam dados dos chamados órgãos de controle – entre os quais se inclui Banco Central e Receita Federal. A medida paralisou, por exemplo, a investigação sobre o filho do presidente, Flávio Bolsonaro, acusado de “rachadinha” (ficar com parte do salário de seus funcionários) na época em que exercia o cargo de deputado estadual no Rio de Janeiro.
Ele declarou ainda que muita informação errada foi divulgada sobre sua decisão de suspender as investigações. “Quem aqui é contra o combate à corrupção e à lavagem de dinheiro? Temos que acabar com essas lendas urbanas, esses caluniadores.”
Autonomia
O presidente do STF defende que ao trabalhar para outros departamentos, “por encomenda”, requerendo extratos bancários para uma investigação, por exemplo, a UIF perde autonomia e passa a depender de solicitações, sem fazer seu trabalho, que é o de receber informações necessárias para evitar fraudes.
“Estou falando de autonomia. Sem esse poder, de decidir o que e como buscar informações, ela [UIF] pode ficar dependende de outras instituições.”
Toffoli observou que cabe à UIF apontar atos ilícitos, a partir dos indícios que receber do sistema financeiro, mas ela não tem de apurar a situação de réus ou de cidadãos contra os quais não há qualquer processo.
O ministro declarou que, segundo o Banco Mundial, a UIF deve ter três funções básicas: receber, analisar e disseminar as informações.
O ministro argumentou que, sem autonomia, ocorrerá o que aconteceu no passado do país, quando autoridades de instituições como os Ministérios da Economia e Justiça tinham acesso a todos os relatórios de dados fiscais sigilosos.
“Como disse [o procurador-geral da República] Augusto Aras, os relatórios de inteligência financeira jamais podem ser considerados como prova, porque eles não passaram por nenhum crivo e, muitas vezes, têm inconsistências”, afirmou. “A UIF não tem nenhum poder persecutório ou investigatório”, repetiu algumas vezes.
Encomenda é ilegal, diz ministro
Toffoli diz ser ilegal a prática de criação de relatórios de inteligência financeira “por encomenda”, contra cidadãos que não estão sequer sob investigação. Segundo ele, o nome dessa prática é “fishing expedition” (expedições de pesca, em inglês).
Em alguns momentos da sessão o clima esquentou entre Toffoli e o procurador-geral. Em um deles, o ministro do Supremo afirmou o Ministério Público costuma receber dados como extratos bancários, contracheques, notas fiscais e demonstrativos de imposto de renda, o que, garantiu, é proibido pela legislação.
Ele declarou que, em caso de representações para fins penais, as informações e movimentações do contribuinte podem ser repassadas ao MP. “Mas documentos sensíveis, como extratos bancários e declaração de imposto de renda, não devem ser compartilhados, exceto mediante autorização judicial.”
Toffoli afirmou ainda que o Brasil segue padrões internacionais para unidades de investigações e diz que recomendações do Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo (Gafi) não negam direito ao sigilo fiscal e bancário.
No início de seu voto, pela manhã, Toffoli disse que o julgamento do STF não é sobre o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), envolvido no suposto esquema de rachadinha.
Augusto Aras, que foi o primeiro a fazer a sustentação no plenário do STF, defendeu que não é necessária autorização prévia para compartilhamentos da UIF.
Em seguida, opinou que entre as consequências decorrentes da decisão da Corte de impor limites ao repasse de informações estão a dificuldade de acesso a créditos internacionais para projetos de desenvolvimento, redução do rating de investimento do Brasil por agências internacionais e danos político-diplomáticos.
FONTE: R7.COM
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