“Quadrilha reúne os maiores desmatadores da Amazônia”, diz procurador Paulo de Tarso Moreira Oliveira, de Santarém (PA), afirma que gente muito perigosa se utiliza do WhatsApp para organizar crimes como o ‘dia do fogo’
“O esquema de grilagem de terras públicas, continua vivo no sudoeste do Pará. Trata-se de uma quadrilha conhecida e muito bem organizada.” A afirmação é do procurador da República Paulo de Tarso Moreira Oliveira, que fica em Santarém, no Pará. Ele recebeu a reportagem da Revista Globo Rural em seu gabinete na tarde desta quinta-feira (12/9) para falar sobre as investigações a respeito das queimadas na região e principalmente sobre o ‘dia do fogo’.
“O trabalho deles é feito por vários grupos de criminosos. Tem gente encarregada de desmatar, outros de vender a madeira de lei, os incendiários, que se encarregam de queimar o que restou e semear o pasto. E depois entra outro grupo, encarregado de encontrar laranjas que emprestam seus CPFs para assumir esses crimes. Esses laranjas são transformados em (posseiros), eles alugam seus nomes para a produção de documentação falsa, e até para assumir as multas do IBAMA. Dentro da quadrilha tem também o setor imobiliário, que se encarrega de oferecer essas áreas a preços irrisórios principalmente no sul do país. O (modus operandi) é basicamente este – invasão de terras públicas, apostando que em algum momento o estado brasileiro vai ceder a pressão do grupo e terminar liberando essas áreas. Com a liberação, isso acaba valendo uma fortuna”, diz ele.
Segundo o procurador, o MPF descobriu que no caso do ‘dia do fogo’ o alvo principal da quadrilha foi a Floresta Nacional do Jamanxim. “As informações dos satélites mostram isso claramente. Essa quadrilha atua na região há muitos anos. Ela foi desbaratada na Operação Castanheira, em agosto de 2014, pela Polícia Federal, Ibama, Receita Federal e MPF. Na época, o desmatamento e os incêndios despencaram, mas tudo indica que o esquema continua vivo. É gente muito perigosa que se utiliza das redes sociais, principalmente Facebook e WathsApp para ameaçar fiscais e cometer crimes como os do ‘dia do fogo’, diz Oliveira.
No dia 10 de agosto, um grupo formado por grileiros, garimpeiros, comerciantes e fazendeiros, convocado pelo WhatsApp, teria provocado várias queimadas pelas florestas de Novo Progresso e Altamira. O crime, que vem sendo chamado de ‘dia do fogo’, está sendo investigado pelas Polícias Federal e Civil. Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) indicam que os dois municípios do Pará tiveram números recordes de desmatamento e queimadas este ano.
Impunidade
Segundo o Ministério Público Federal, a maioria desses condenados já deixou a prisão e continua cometendo crimes. Consta na página do órgão na internet que o recordista de condenações da Operação Castanheira é o empresário Ezequiel Antônio Castanha, cuja somatória dos crimes na época da operação era de até 54 anos de cadeia e multa de cerca de R$ 30 milhões.
Em fevereiro de 2015 ele apareceu algemado em reportagem veiculada pelo Jornal Nacional. Sua prisão foi anunciada pela apresentadora Renata Vasconcelos com o seguinte texto: “Uma ação conjunta da Polícia Federal, Ministério Público Federal e IBAMA, prendeu o homem, considerado o maior desmatador da Amazônia”. A reportagem dizia que Ezequiel Antônio Castanha foi preso no município de Novo Progresso.
Castanha passou apenas seis meses na prisão. E o Ministério Público do Pará, em sua página na internet diz que “Ezequiel Antônio Castanha já voltou a ser processado pelo MPF por três vezes após a denúncia relativa à Operação Castanheira, pela qual ele foi preso em 2015”.
Circula em Novo Progresso que ele e mais outros três condenados na época, fizeram acordo com a justiça e estão sendo monitorados por tornozeleiras eletrônicas. No dia 6 de maio de 2015, Ezequiel inaugurou em Novo Progresso a primeira loja do “Castanha Supermercados”, de sua propriedade. Hoje ele conta com duas lojas na cidade e criou uma rede espalhada em outros municípios.
Apesar disso, o procurador Oliveira não perde as esperanças de colocar na prisão os responsáveis pelo ‘dia do fogo’. “Se a Polícia Civil do Pará e a Federal, que estão investigando há mais de 30 dias, não desvendarem os autores desse crime, nós do Ministério Público vamos entrar em ação. Claro que nosso papel principal já foi feito, denunciando três dias antes ao Ibama que este crime estava sendo planejado e depois pedindo às autoridades federais que instaurassem o inquérito imediatamente. Nosso pedido de urgência se baseava nas informações de vocês da imprensa sobre o planejado do dia do fogo via WhatsApp. Isso exigiria a quebra dos sigilos dos telefones dos membros do grupo que tramaram o crime. Mas só vinte dias depois é que a Polícia Federal instaurou o Inquérito. A Polícia Civil, sim, começou seu trabalho bem antes e ainda não divulgou os resultados”, afirma o procurador.
Ele diz que o MPF já foi informado pelos agentes da Polícia Federal que o delegado Daniel Mattos Mathias Pereira, da Polícia Civil de Novo Progresso, se recusa a fazer parceria com os agentes da Polícia Federal “para agilizar isso”.
Para Oliveira, a cisão entre Polícia Civil e Militar de Novo Progresso e a Federal não é um fato novo. “Ano passado a Polícia de Novo Progresso prendeu três agentes da Federal que estavam a serviço na região e alegou que ali era área deles. Os agentes passaram uma noite na prisão até que nós conseguimos liberá-los.”
O Procurador diz que para investigar redes sociais e lavagem de dinheiro dessas quadrilhas o Ministério Público Federal não tem ferramentas, mas para descobrir os autores dos desmatamentos sim. “O desmatamento deixa muitos rastros – diz ele – e nós vamos segui-los, custe o que custar.”
Após um mês, nenhuma denúncia
Passados mais de 30 dias do dia do fogo até agora ninguém foi denunciado. O ronco dos motosserras por enquanto silenciou por aqui, onde o fogo ainda arde em focos isolados. As únicas pessoas presas por grilagem foram: Silvanira Teixeira de Paula, Francisco das Neves Ferreira e Antônio dos Santos. A Delegacia Especializada em Conflitos Agrários de Santarém, numa operação conjunta com a Polícia Civil de Altamira, efetuou as prisões no Distrito de Castelo dos Sonhos, na margem da BR-163. Os três foram acusados de invadir a Floresta Nacional do Jamanxin.
Vinte e três pessoas foram denunciadas pelo MPF em 2014 na Operação Castanheira. A informação consta na página do órgão na internet. Elas foram acusadas de 17 crimes e que na somatória geral, resultam em condenações de 1.077 anos de prisão, além de multas milionárias. O grupo, segundo o MPF tem ramificações em Mato Grosso, Paraná e São Paulo e são considerados “os maiores desmatadores da Amazônia brasileira”.
FONTE: GLOBO RURAL COM G1.COM
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