Mundo

Haiti pede ajuda dos EUA e da ONU com tropas militares após assassinato do presidente

O governo americano não confirmou o envio das tropas, mas a Casa Branca afirmou que mandará agentes do FBI e do Departamento de Segurança Interna

Com a tensão e a incerteza que tomaram conta do Haiti após o assassinato do presidente Jovenel Moïse, o governo do país caribenho pediu que os Estados Unidos e a ONU enviem tropas militares para ajudar a proteger peças-chave da infraestrutura local, como aeroporto e reservatórios de gasolina.

O governo americano não confirmou o envio das tropas, mas a Casa Branca afirmou que mandará agentes do FBI e do Departamento de Segurança Interna, além de vacinas contra a Covid ao único país das Américas que ainda não começou a imunizar sua população.

Já o pedido à ONU traz à memória a Minustah, missão que reuniu, entre 2004 e 2017, tropas para tentar estabilizar o Haiti. A operação teve protagonismo do Brasil, que, excetuando-se breves intervalos, comandou um contingente internacional que chegou a ter mais de 7.000 militares de 22 países.

Os Estados Unidos foram envolvidos na morte de Moïse desde o começo, depois que autoridades haitianas afirmaram que alguns dos assassinos falavam inglês com sotaque americano e se apresentaram como agentes do DEA, órgão antidrogas do país, para entrar na casa do presidente.

O Departamento de Estado dos EUA, responsável pela diplomacia americana, correu para descartar a teoria, mas a hipótese de responsabilidade do país ganhou força depois que dois haitianos-americanos foram presos na quinta-feira (8), um dia após o assassinato, junto a um grupo de 15 colombianos.

Um terceiro ator estrangeiro acabou envolvido na confusão: Taiwan. Dos 17 presos até agora, 11 foram detidos após tentarem invadir a embaixada da ilha asiática e trocarem tiros com a polícia. Junto com eles, passaportes colombianos, rifles, facões, rádios comunicadores, alicates e martelos.

Joanne Ou, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores taiwanês, disse nesta sexta que os seguranças do prédio perceberam a presença do grupo no pátio do edifício e avisaram a cúpula da embaixada e a polícia. O prédio, que fica próximo à casa onde Moïse foi morto, já tinha sido esvaziado na quarta por questões de segurança e, por isso, não havia ninguém no local no momento da invasão.

A revelação do caso joga luz na relação entre Porto Príncipe e Taipé. O Haiti é um dos 15 países do mundo a reconhecer Taiwan como um país independente. A pequena cifra se deve à pressão exercida pela China, que considera a ilha uma província rebelde e, por isso, recusa-se a manter relações diplomáticas com quem mantém elos formais com Taiwan. “Nesse momento difícil, o governo de Taiwan reitera seu apoio à capacidade do primeiro-ministro interino, Claude Joseph, em liderar o Haiti durante essa crise e a restaurar a ordem democrática. Taiwan condena fortemente essa ação violenta e barbára”, afirmou Ou nesta sexta.

A polícia haitiana afirma que, até o momento, a investigação indica que 28 pessoas participaram do crime. Além dos que já estão presos, outros quatro criminosos foram mortos na noite de quarta, durante confronto com as forças de segurança, e o restante do grupo está foragido. Os haitianos-americanos presos foram identificados como James J. Solages, 35, e Joseph Vincent, 55. Segundo o New York Times, eles dizem terem sido contratados como tradutores pelos colombianos.

Solages tem um site voltado a ações de caridade para crianças no Haiti, e na descrição da página se define como “agente diplomático certificado” e “ex-comandante chefe dos guarda-costas” da embaixada do Canadá no país caribenho. A descrição foi removida na quinta, mas ainda é possível encontrá-la em arquivos na internet. Americano naturalizado, ele vive em Tamarac, na Flórida, e não tem antecedentes criminais. Detalhes da vida de Vincent, por sua vez, não foram divulgados até a tarde desta sexta.

Fontes ligadas a órgãos americanos de inteligência disseram à agência de notícias Reuters que os EUA abriram uma investigação interna para apurar o envolvimento dos detidos com o assassinato. Já o governo da Colômbia entrou na investigação depois de confirmar a presença de 17 militares reformados do país na lista de envolvidos no crime —além dos 15 presos, 2 dos mortos.

Entre os nomes já identificados está o de Manuel Antonio Grosso Guarín, ex-membro da elite do Exército colombiano, suspeito de liderar o grupo de mercenários que matou Moïse, segundo a revista Semana.

Guarín e três outros ex-militares colombianos teriam viajado em 4 de junho de Bogotá para a República Dominicana. Dois dias depois, o grupo cruzou a fronteira por via terrestre, de acordo com o jornal El Tiempo —fotos no Facebook de Guarín mostram ele em Punta Cana nesse período. Outra leva de colombianos teria chegado ao Haiti em maio, a partir de um voo de Santo Domingo, capital dominicana.

Há, ainda, a suspeita de que seguranças do presidente estejam envolvidos no assassinato. Um ex-senador, Steve Benoit, levantou a hipótese em seu programa de rádio nesta sexta. “Moïse foi assassinado por seus agentes de segurança. Não foram os colombianos. Foram contratados pelo Estado haitiano”, afirmou.

Depois, o diário El Tiempo publicou reportagem segundo a qual uma fonte ligada às investigações afirmou que os mercenários colombianos chegaram à casa do presidente uma hora e meia após a morte, corroborando a hipótese de que Moïse pode ter sido assassinado pelos seus agentes.

Com a morte do presidente, o premiê interino Claude Joseph assumiu o comando do país e declarou estado de sítio durante duas semanas, medida que amplia os poderes do Executivo. Há dúvidas, porém, sobre sua legitimidade, já que o sucessor de Moïse, segundo a Constituição, seria o presidente da Suprema Corte. O cargo, porém, está vago desde que seu titular, René Sylvestre, morreu de Covid-19.

Para deixar a situação ainda mais delicada, um novo premiê, Ariel Henry, deveria ter assumido o posto na quarta-feira, dia do assassinato de Moïse, e os desdobramentos do crime acabaram impedindo a transferência de poder. Assim, Joseph segue no comando, com o apoio dos EUA e da ONU, sob o discurso de que a prioridade no momento é encontrar os mandantes da morte do presidente haitiano.

Os mandantes e as motivações do crime, porém, seguem desconhecidas. A hipótese de os assassinos serem estrangeiros já havia sido levantada pelo próprio Joseph pouco depois do crime. Ele disse na quarta-feira que os criminosos foram ouvidos falando em inglês e espanhol, o que indicaria que não são haitianos, já que os idiomas oficiais do país são o francês e o crioulo.

Segundo a imprensa local, citando o juiz encarregado do caso, Moïse foi encontrado com ao menos 12 marcas de tiros. “O escritório e a sala foram saqueados. Nós o encontramos deitado de costas, [usando] calça azul, camisa branca manchada de sangue, boca aberta, olho esquerdo furado”, disse o magistrado Carl Henry Destin ao jornal haitiano Le Nouvelliste.

Jomarlie, filha do casal, estava em casa durante o ataque, que ocorreu pela madrugada, mas conseguiu se esconder num dos quartos. A primeira-dama, também baleada, foi transferida para receber tratamento em Miami e, segundo Joseph, está fora de perigo e em situação estável.

Na quinta, centenas de pessoas se reuniram do lado de fora da delegacia em que os suspeitos estão detidos em Porto Príncipe. Aos gritos de “queimem-nos”, atearam fogo em um veículo que presumiram ser dos assassinos. A ação, que se soma a um longo histórico de manifestações violentas nas ruas haitianas, levou o premiê interino do país a fazer um apelo para que a população não linche os suspeitos.

O caso acirrou a crise política do país, que tinha no centro da disputa uma discussão sobre o término do mandato de Moïse. Ele foi eleito em 2015 e deveria ter tomado posse em 7 de fevereiro de 2016 para um mandato de cinco anos. Em meio a acusações de fraudes, porém, o pleito foi anulado e teve que ser refeito no ano seguinte. Durante esse período, o país foi comandado por um governo interino.

Moïse saiu vencedor na nova votação e assumiu o comando do Haiti em 7 de fevereiro de 2017. Como o mandato presidencial no país é de cinco anos, ele alegava que deveria permanecer no cargo até fevereiro de 2022, portanto —uma alegação apoiada pela Organização dos Estados Americanos (OEA) e pelo governo do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden. A oposição, porém, defendia que seu mandato deveria ter se encerrado em fevereiro deste ano.

Em meio a essa discussão, o então presidente decidiu suspender dois terços do Senado, toda a Câmara dos Deputados e todos os prefeitos e passou a comandar o país via decretos —o que rendeu uma onda de protestos contra o governo e acusações de autoritarismo.

FONTE: FOLHA.COM

Comentar

Print Friendly, PDF & Email

About the author

Marcio Martins martins

Add Comment

Click here to post a comment

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

COMPARTILHE

BAIXE NOSSO APLICATIVO

RESENHA POLITICA

TEIA DIGITAL

TEMPO REAL

PUBLICIDADE

Instagram

Instagram has returned empty data. Please authorize your Instagram account in the plugin settings .
WP2Social Auto Publish Powered By : XYZScripts.com