20 mil caçadores têm aval do Exército para comprar arma; só 7 mil têm cadastro no Ibama
O arsenal dos cerca de 20 mil caçadores brasileiros cadastrados no Exército é semelhante ao da Polícia Militar do Estado de São Paulo: 92 mil armas — sendo 16 mil delas de uso restrito. Poucas dessas armas, no entanto, já foram usadas em uma caça bem-sucedida no País.
Em 2014, foram abatidos ao todo apenas 518 javalis, única espécie passível de caça no Brasil. Em 2013, o total de animais caçados não passou de 396.
O número de armas e de caçadores cadastrados no Exército constam do Sigma, banco de dados de uso exclusivo do Exército. O total de animais abatidos foram passados ao R7 pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).
O cruzamento de dados das duas instituições revela ainda que o Exército concede o porte de arma para caça a pessoas que não possuem cadastro de caçador no Ibama. O órgão ambiental possui apenas 7 mil caçadores cadastrados — 13 mil a menos que o total de pessoas autorizadas pelas Forças Armadas para comprar arma de caça.
Há, porém, casos de caçadores que tiram registros para praticar a atividade em outros países — na América Latina, Argentina e Uruguai têm tradição de caça.
O Exército confirmou ao R7 que não exige o cadastro no Ibama para conceder certificado de caçador e autorizar a compra de arma. “O registro no Exército habilita a pessoa a adquirir armas e munições para a atividade de caça. A autorização do Ibama é específica para o local e período de caça. Assim, são procedimentos independentes”, afirmou o órgão após ser questionado pela reportagem.
Os números do Ibama e do Exército incluem apenas caçadores esportivos: os chamados caçadores de subsistência, que caçam para se alimentar, são controlados pela Polícia Federal e estão registrados em um banco de dados separado.
Critério
Coordenador da área de Sistemas de Justiça e Segurança Pública do Instituto Sou da Paz, Bruno Langeani critica a falta de diálogo entre as duas instituições.
— A interlocução entre os órgãos é importante para que o Exército tome os cuidados necessários para só conceder registro de caçador a quem fato vai caçar.
Langeani afirma que o Instituto Sou da Paz não é estritamente contra a concessão de registro a caçadores.
— Dos três tipos de registro de CAC [caçadores esportivos, atiradores esportivos e colecionadores], no nosso entendimento o mais flagrantemente problemático é o caso dos colecionadores. Acreditamos que não faça sentido uma coleção particular de armas. No caso dos caçadores e atiradores, o que temos buscado é que seja criterioso.
Em relação aos caçadores que atuam fora do Brasil, Langeani afirma que poderiam manter ou alugar a arma no país em que costumam caçar.
— Não é interessante que uma arma que só é usada em outros locais fique guardada no Brasil. Além disso, é complicado autorizar que armas passem pela fronteira, tanto na saída como na chegada.
Furtos, roubos e extravios
Desde de 2003, quando o sistema Sigma foi criado, 1,3 mil armas de caçadores foram furtadas, perdidas ou extraviadas — cerca de 250 são de uso restrito. Os números foram obtidos pelo R7 no ano passado por meio da Lei de Acesso à informação.
Questionado sobre o armazenamento de armas, o Exército afirmou que “para a concessão e revalidação de registro que autoriza as atividades de colecionamento, tiro desportivo e caça é exigida a comprovação das condições de segurança do local de guarda das armas por meio documental e realização de vistorias”.
“As operações de fiscalização estão sendo conduzidas em um ambiente interagências, priorizando parceria com órgãos de segurança e ordem pública e agências governamentais”, afirmou o Exército. De acordo com o órgão, foi criado o Centro de Operações de Produtos Controlados para coordenar as operações.
O Exército afirma ainda que tem investido em tecnologia e ampliado a capacitação do efetivo responsável pela fiscalização de produtos controlados. Além disso, o órgão afirma que ampliou o teto da multa aos gestores negligentes.
Caça de javalis
O Ibama afirma que a autorização de caça de javalis — chamada tecnicamente de “controle” ou “manejo” —foi uma decisão tomada após ser detectado que o animal tem se espalhado pelo País.
De acordo com João Pessoa Riograndense Moreira Júnior, coordenador-geral de fauna e pesca do Ibama, o javali provavelmente chegou ao Brasil pelo Rio Grande do Sul nos anos 1980 como animal de criação. Na década seguinte, alguns fugitivos começaram a atacar plantações na região.
— [O javali] é uma espécie exótica invasora considerada pelas autoridades mundiais no assunto uma das cem piores espécies invasoras do mundo. Causam danos ao meio ambiente, à pecuária. E causam também problemas de segurança, porque são animais agressivos. Então o Ibama em 2013 editou uma normativa autorizando em todo o País esse controle.
Como, segundo Moreira Junior, não há predadores do javali no País, a espécie se prolifera livremente. Nos últimos anos, aumentou o número de relatos de animais em outros Estados. Hoje, há relatos do animal até na Bahia.
Mardqueu França Filho formou um grupo de caçadores do animal na região de Monte azul Paulista, interior de São Paulo.
— Desde 2013, nós tínhamos algumas ocorrências de javali. Mas era esporádico. Isso só veio a tomar proporção no final de 2014, início de 2015. Os produtores começaram a perceber o surto. Produtores que tinham milho, batata doce perceberam mais rapidamente, pois foram diretamente atacados. […] Eu já era atirador e caçador desde 2008. Eu praticava já a caça fora do País. Então os produtores que sabiam que eu caçava começaram a me procurar.
O caçador afirma que, quando sai para caçar, é difícil não abater um animal. Ele, porém, admite que a solução é pontual: como os javalis andam em bando, a maior função da caça é espantar o grupo de dentro da propriedade de que chamou os caçadores.
Fonte: R7
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