Com 2,1 mil horas de aula para formação geral, quem optar pela instrução técnica corre risco de se submeter ao Enem em desvantagem — afinal, terá 300 horas a menos do que aquele que seguir o formato tradicional
A reforma do ensino médio, aprovada terça-feira, na Câmara dos Deputados, pode prejudicar o estudante que optar pelo ensino profissionalizante. Isso porque o substitutivo ao Projeto de Lei (PL) 5.230/2023, elaborado pelo deputado Mendonça Filho (União-PE), reduziu para os alunos que fizerem esta opção a carga horária da formação geral. A partir de 2025, serão 2,1 mil horas contra as 2,4 mil horas estabelecidas para o ensino tradicional.
A proposta elaborada no Senado, que foi rejeitada na Câmara, propunha que os dois formatos de ensino teriam 2,4 mil horas cada. No entendimento de especialistas ouvidos pelo Correio, o aluno que optar pelo profissionalizante terá um contato menor com as disciplinas básicas — como português, matemática, biologia ou física. São 300 horas a menos que o estudante que decidiu seguir a educação tradicional. O temor é que isso abra um abismo entre os conhecimentos daqueles que forem prestar o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).
“(A reforma do ensino médio) reduz a carga horária básica para quem optar pela formação técnica e os coloca em desvantagem porque não terão acesso ao mesmo conhecimento dos demais. Sabemos o quanto é seletivo o ingresso para um curso superior no Brasil, especialmente nas universidades públicas. Vai prejudicar os jovens mais pobres, os que vão se profissionalizar”, avalia Mônica Silva, professora e coordenadora do grupo de pesquisa Observatório do Ensino Médio, da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Ela afirma que faltou discussão na Câmara dos Deputados sobre as propostas feitas pela senadora Dorinha Seabra (União-TO). “A votação trouxe prejuízos. O texto do Senado dava muito mais elementos para assegurar um ensino médio de qualidade”, lamenta.
Porém, seja para o aluno que optar para o ensino formal, seja para aquele que seguir a formação profissionalizante, nos dois casos terão de cumprir, anualmente, 3 mil horas de aulas.
A menor carga para as matérias básicas no ensino técnico também chamou a atenção no movimento secundarista, que considerou negativa a redução para 2,2 mil horas. “O texto do Senado estava muito melhor. Fomos surpreendidos pela votação atropelada na Câmara”, critica Hugo Silva, presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes). Para ele, o ideal seriam as 2,4 mil horas básicas iguais para todos.
Outro aspecto negativo da reforma aprovada, segundo Hugo, foi a retirada da obrigatoriedade de as escolas oferecerem o ensino médio noturno, que garantiria acesso, principalmente, àqueles alunos oriundos da Educação de Jovens e Adultos (EJA) — uma vez que trabalham durante o dia. “A gente vai se mobilizar para pressionar o Ministério da Educação (MEC) a vetar esses pontos negativos para os estudantes”, adiantou.
Para o Movimento Todos Pela Educação, a reforma aprovada dá “flexibilidade” às redes de ensino. “Dá uma possibilidade de as redes terem muito mais flexibilidade e garantirem a formação geral básica, que permite ao aluno ter um bom desempenho no Enem e continuar os estudos no ensino superior”, observa Priscila Cruz, presidente-executiva da instituição.
O ponto positivo de consenso entre os especialistas é a melhor definição dos chamados “itinerários formativos”. Seria uma forma de os estudantes aprofundarem o conhecimento na área de maior interesse, com vistas ao ensino superior. O texto aprovado prevê que o Conselho Nacional da Educação definirá quais são os itinerários possíveis e como serão implementados.
FONTE: CORREIO BRAZILIENSE
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