Demora no desembaraço de mercadorias prejudica setores como fabricantes de eletroeletrônicos
A queda de braço entre fiscais da Receita Federal e demais categorias do serviço público, como técnicos da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), sobre a necessidade de os agentes passarem pela inspeção por raio-X ao entrar na área de embarque dos aeroportos, a exemplo dos demais passageiros, vem causando efeitos colaterais na operação de aeroportos e em cadeias produtivas dependentes de insumos trazidos ao Brasil por avião.
Um dos efeitos é a lentidão no desembaraço alfandegário em alguns aeroportos. É uma consequência da ‘operação padrão’ feita pelos fiscais da Receita em retaliação às normas mais rígidas para o acesso deles às áreas restritas. Em Viracopos, em Campinas (SP), maior porta de entrada e saída de cargas transportadas por avião do Brasil, o tempo médio de desembaraço subiu de dois a três dias para 15 a 20 dias, de acordo com pessoas que conhecem a operação no aeroporto.
O prejuízo em Viracopos tem afetado diretamente a operação do aeroporto. Segundo as fontes ouvidas pelo GLOBO, fiscais da Receita estão impedindo que funcionários de Viracopos formem filas com centenas de carrinhos de bagagem e entrem com eles diretamente na área restrita, de modo a evitar que os passageiros fiquem sem a comodidade ao retirar as malas da esteira. O resultado: quem tem andado por Viracopos nos últimos dias tem se deparado com a falta de carrinhos junto às esteiras. A administração do aeroporto lamenta os transtornos causados pelo impasse entre servidores públicos.
– Quem sofre na disputa entre governos é o aeroporto e o passageiro. É surreal acontecer isso em aeroporto em pleno século XXI – diz Gustavo Müssnich, diretor-presidente da concessionária que administra Viracopos.
Procurada, a GRU Airport, concessionária que administra Guarulhos, respondeu em nota que “em relação à inspeção compulsória por qual passam os agentes federais, o aeroporto cumpre a legislação vigente, que determina a vistoria a quem ingressa nas áreas restritas.”
No Rio, também em protesto, os servidores fizeram operação-padrão na quinta-feira no aeroporto do Galeão, causando filas e transtornos para os passageiros.
Sem componentes
A queda de braço causa problemas à indústria que depende do transporte aéreo para importação de insumos. É o caso da cadeia de eletroeletrônicos. De acordo com Humberto Barbato, presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), 30% das peças dos computadores e celulares feitos no Brasil chegam ao país via Viracopos e Guarulhos, dois terminais com registros da ‘operação padrão’ por parte dos servidores da Receita.
O problema é que, para reduzir custos com estoques, as fabricantes de eletrônicos mantém complexas operações logísticas para despacho de peças a poucos dias do uso em linhas de produção automatizadas – o chamado sistema ‘just in time’. Por isso, sem os 30% de peças, a indústria de eletrônicos corre risco de parar.
– A partir da semana que vem, caso a situação não mude, deveremos ter paralisações nas fábricas de eletrônicos por falta de insumos – diz Barbato.
A entidade ainda não tem estimativa de perdas financeiras com a situação, mas acompanha atentamente o assunto. Em 29 de janeiro, a Abinee mandou carta ao governo federal pedindo uma solução para o problema. Nesta sexta-feira (8/2), Barbato telefonou para o economista Carlos da Costa, secretário especial de produtividade no Ministério da Economia, cobrando soluções. Segundo Barbato, Costa está empenhado em resolver a questão.
Para a Unafisco, sindicato dos servidores da Receita Federal, por trás da insatisfação da categoria está o fato de que a inspeção em vigor nas últimas semanas vai contra a Constituição. De acordo com Mauro Silva, presidente da Unafisco, o artigo 37 da Carta Magna estipula a “precedência constitucional” dos funcionários da Receita sobre as demais categorias do serviço público. A norma da Anac, portanto, seria inconstitucional, de acordo com o sindicato.
– Queremos normalidade jurídica, com fiscalização aduaneira forte e rígida e sem passar por esses controles – diz Silva, que diz estar aberto ao diálogo com o governo federal para a redação de uma norma que pacifique a questão.
Em nota, a Anac afirmou que a inspeção de segurança em aeroportos é um “procedimento padrão e utilizado por diversos países em todo o mundo, de acordo com orientação da Organização Internacional de Aviação Civil (OACI)”. De acordo com a agência, o objetivo da medida é “assegurar os níveis de segurança dos aeroportos, que é dever de todos que ali trabalham”.
FONTE: O GLOBO
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