Cultura

O ódio – Por Alberto Ayala

  O ódio é um vil sentimento extremamente fétido que mata-nos sofisticadamente aos poucos, aos poucos, aos pouquinhos. O olhar torna-se feio, obscuro. O ar de inocência se vai. Como somos tolos! Perdemos a valiosa oportunidade de exercer a humildade e optamos pela latente presença da escuridão. E lembre-se: más escolhas sempre geram tristes consequências.

   A vaidade do eu é a mesma. Não há o querer da mudança sincera. É mais fácil deixar o rancor vivo. Parece até justo. Poderia ser justo sim. Não é.

   Cargas negativas nos cercam. Resta os dias cinzas. As flores perdem o encanto. O mar já não é tão belo aos olhos. Deus parece distante. Um Ser sem muito sentido. A mágoa é nociva.

    – A arte não te encanta, Celso? – perguntou-me Olívia.

Refleti um mínimo instante. Sorri. Sorriso amarelo.

– Não. A arte não me encanta. Perdi a sensibilidade.

– Nem Mulher com sombrinha, de Claude Monet?

– Nem Abaporu, de Tarsila do Amaral.

– Você está morto, Celso?

– Talvez, Olívia. Talvez. Talvez esteja interiormente morto.

Estava. Morto estava eu. Não sabia disso. A cegueira tomou-me completamente. Lamentável é estar doente na alma e achar-se são. Engano total, mortal em alguns casos.

– Por que você perdeu a sensibilidade, Celso? – quis saber minha irmã.

     Não respondi. Silencio fúnebre. Morreu alguém? Eu morri mesmo estando vivo. O ódio fez-me uma criatura fraca no poder de superar os obstáculos da vida. Fui sepultado num cemitério invisível. Almas perdidas eternamente? Óbvio que não! Porém, quão complicado é ressuscitar daquele lugar e dar um testemunho digno de aplausos.

      Jogaram rosas no meu caixão marrom? Não. Não jogaram rosas no meu caixão. Nem uma sequer. Nem a amante que eu sustentava e que fazia-me sentir prazer sexual nas noites quentes. Nem o meu filho ingrato, viciado nas drogas e preguiçoso. Nem o meu pai que bebia excessivamente. Nem os meus irmãos egoístas, perdidos nos próprios delitos. Nem a mulher com que casei no ano de 1977. Nem os AMIGOS. Todos falsos, interesseiros e perigosos.

  1. Antes de morrer. Li A hora da estrela, de Clarice Lispector. 1977. Um marco na obra literária da autora reconhecida pelo talento. Li e até que achei interessante. Mas… Não gostei muito. Li Dom Casmurro, do romancista Machado de Assis. Uma boa trama! Entretanto, a história pareceu-me melancólica. E a melancolia trazia-me pensamentos vazios.

    Visitei museus históricos. Fui dançar por Paris, vivi paixões intensas, consegui ficar rico e nada tirou de mim o rancor, a fúria maligna. Ilusões me agraciavam suavemente. Levemente.

    – Eu me sinto meio sem rumo, sem direção. Sem paz – desabafei diante de um sábio idoso certa vez.

    Ele fitou-me. Analisou-me. Indagou:

– Por que se sente desse jeito?

Abaixei os olhos. Lágrimas escorreram pelo meu rosto branco.

– Eu tenho ódio do meu pai.

– Ódio, seu Celso?

– Sim, senhor. Ódio. Um ódio, um rancor violento daquele desgraçado.

– Isso não pode. A mágoa só te fará mal. Você está se matando devagar. Bem devagar, seu Celso. Isso não pode.

– E como faço para perdoar meu pai?

– Perdoe ele sem seguir seu coração. Use a mente.

– Perdoar ele?

      – Sim. Ele plantou a semente do ódio em você. E você, seu Celso? Quer plantar a semente do ódio ou do amor?

      Tais palavras ficaram na minha cabeça martelando por dias e dias e dias. Aconteceu que eu o perdoei. Por que fiz isso? O perdoei por entender que apenas me afundava na podridão. Ele vivia a sua vida. E eu? Eu morri antes dele. De vítima me transformei em vilão cruel. Cruel comigo mesmo. O perdão me fez sorrir com vontade. Me fez encontrar uma companheira. Me casarei mês que vem.

  Autor; Alberto Ayala

Alberto Ayala, 17 anos, natural de Porto Velho, é estudante do Terceiro Ano do Ensino Médio na Escola João Bento da Costa na Capital:  Alberto Ayala  é um contista iniciante e desde cedo já demonstra sua vocação para escrever poesias e contos.

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Gomes

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