Para especialista, o atual modelo não funciona. Na passagem do ensino fundamental I para o II, as crianças enfrentam diversas mudanças, em uma fase da vida já marcada por transformações
O Índice de Desenvolvimento de Educação Básica (Ideb), divulgado na quarta-feira (14), mostrou uma melhora nos anos iniciais do fundamental e estagnação nos anos finais e no ensino médio. Especialistas em educação apontam para “efeito cascata” nos níveis da escolaridade brasileira.
“Os dados do fundamental II (entre o 6º e o 9º ano) sempre foram piores que o I (entre o 1º e 5º ano) porque é uma transição muito dramática para as crianças. Então, elas chegam no ensino médio com uma defasagem enorme, que acumularam ao longo dos anos”, comenta Daniela Caldeirinha, vice-presidente de educação da Fundação Lemann.
Os resultados do último ano mostraram que o Brasil alcançou a meta de 6 pontos no Ideb nas séries iniciais do fundamental. No entanto, o mesmo não ocorreu nas séries finais do fundamental — em que a média ficou em 5 contra os 5,5 da meta nacional — nem no ensino médio, com média de 4,3, quase um ponto longe da meta de 5,2. A transição a que a especialista se refere é a troca de um professor, nas séries iniciais, para vários, desfazendo um vínculo em meio a uma idade que tem, por si só, várias mudanças.
“Esse modelo não está funcionando”, defende. Ainda de acordo com a especialista, os locais que atingiram a meta nacional do Ideb nos anos finais (5,5), como Ceará, Goiás e Paraná, investiram em reforço escolar. “Quem foi melhor colocou de pé estratégias para a recomposição, que tem a ver com currículo priorizado, com base naquilo que é essencial para as crianças aprenderem com extensão de carga horária (para 5,7,9 horas), tutoria e apoio mais direcionado para alunos com dificuldades”, defende Caldeirinha. O desempenho mais baixo no ensino médio, portanto, é resultado de vários anos de dificuldade. “Percebemos uma tendência geral de estagnação. É verdade que o Brasil alcançou a meta nos anos iniciais que estava prevista, mas além de ser um patamar baixo, a gente teve muita diversidade nos resultados dos estados”, acrescenta a especialista.
A organização sem fins lucrativos Todos Pela Educação partilha dessa ideia e chama atenção para o recorte da rede pública nos ensinos iniciais. “Nos anos iniciais do Ensino Fundamental, o Ideb de 2023 da rede pública foi o mesmo que o de 2019 (5,7). Esse resultado foi alcançado com uma redução no indicador de aprendizagem (6,02 para 5,91) e aumento no indicador de fluxo (0,94 para 0,97).
Apenas seis estados evoluíram no indicador de aprendizagem dos estudantes (nota padronizada do Saeb), com os maiores avanços de Alagoas, Maranhão e Ceará. Além disso, os estados que mais retrocederam foram Mato Grosso do Sul, São Paulo e Roraima”, diz nota publicada no site da organização.
Geração da pandemia
O impacto da pandemia ainda é sentido nos resultados do Ideb, e assim deve seguir até 2031, quando os avaliados terão iniciado a escola em 2022. “Ficou uma grande perda de aprendizagem, perdas humanas, emocionais, de saúde mental, que até hoje impactam a escola. Mas, acho que também ficou uma aprendizagem de que os estudantes são diferentes e, portanto, estarão em lugares diferentes na aprendizagem”, atenta a vice-presidente da Fundação Lemann, que chama atenção para a importância da alfabetização na idade certa —até o 2º ano do ensino fundamental.
“A ausência dos resultados do segundo ano é super importante para quem está trabalhando com política pública e para a escola, porque é o que reflete a alfabetização. A alfabetização não é uma condição suficiente para o bom desempenho do aluno, mas é uma condição necessária. Se o direito das crianças de ler não tiver sido garantido na idade adequada, é mais provável que as dificuldades acumulem e levem aos resultados ruins no ensino médio”, explica Caldeirinha, que critica a falta de dados na divulgação do Ministério da Educação.
Segundo ela, em 2019 e 2021, os dados sobre o segundo ano foram divulgados. A importância, em especial neste ano, é porque abrange justamente a faixa de estudantes que começaram a estudar no período pandêmico.
FONTE: CORREIO BRAZILIENSE
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