Depois da TV, ‘Carcereiros’ chega aos cinemas na forma de bangue-bangue
“Carcereiros” completa 15 anos. Cresceu e botou as manguinhas de fora, como dizem nossas avós quando nos tornamos adolescentes. O criador, Drauzio Varella, vê a criação se afastar dele, mas nem por isso deixa de acompanhá-la com atenção.
Em 2002, o colunista da Folha lançou o livro “Carcereiros”. Era o reencontro com as histórias vivenciadas como médico na prisão depois da consagração com “Estação Carandiru”, de 1999.
Na primeira obra sobre a penitenciária, os presos ocupavam o centro das narrativas. Nesse segundo livro, Drauzio se dedicou aos dramas dos agentes carcerários. Quinze anos depois, veio a TV. Com direção de José Eduardo Belmonte e Rodrigo Lombardi como protagonista, a série da Globo teve duas temporadas. Mais dois anos, veio o cinema.
Nesta quinta (28), estreia o filme inspirado na obra. Entra em cartaz em mais de 500 salas do país, número que situa a produção entre os grandes lançamentos brasileiros do ano.
Mais uma vez, há Belmonte e Lombardi. Também como na produção para a televisão, o roteiro do longa é assinado por Fernando Bonassi, Marçal Aquino, Dennison Ramalho e Marcelo Starobinas.
A série mantinha uma ligação mais evidente com o livro. No filme, esse elo é mais frágil. “É um bangue-bangue”, conta Drauzio num tom bem-humorado. “Ficamos eletrizados na cadeira do cinema.”
A obra de 2002 expunha a tensão ao descrever episódios nas extremidades, dos gestos de heroísmo aos atos de tortura. Mas distendia o ritmo narrativo ao lembrar situações da intimidade dos carcereiros, como passagens familiares. Na versão para o cinema, há muito menos oscilações. É claramente um filme de gênero. No caso, de ação.
Cabe ao carcereiro Adriano (Rodrigo Lombardi) lidar com uma sequência de reviravoltas depois da chegada de um terrorista ao presídio.
Drauzio se manteve distante da produção do filme, uma condição bem aceita por ele. “É preciso se desprender do livro, passa a ser a visão do diretor, dos roteiristas. O autor do livro não deve interferir no filme”, afirma o médico.
Ele também não se envolveu na produção de “Carandiru” (2003), filme dirigido pelo seu amigo Hector Babenco e baseado em “Estação Carandiru”.
Para Belmonte, diretor de produções como “Billi Pig” (2012) e “Alemão” (2014), “Carcereiros” é um projeto com muitas ramificações. “O filme joga luz sobre o livro e a série e, principalmente, leva o público a refletir sobre o tema [o sistema penitenciário no Brasil]”, diz o cineasta.
Essa versão para o cinema, ele ressalta, não se propõe a indicar soluções para o problema. “A gente se apropria da sociologia, mas é outra coisa. A arte não tem que dar respostas, mas preparar o espírito.” É Belmonte o principal responsável pelo efeito eletrizante de que fala Drauzio.
Ao longo dos 17 dias, entre junho e julho de 2018, na zona leste paulistana, foram especialmente intrincadas as filmagens que envolviam explosões e a presença do helicóptero, lembra o cineasta, que realiza com “Carcereiros” sua primeira de ação.
Nesse sentido, a equipe de efeitos especiais e os dublês tiveram especial relevância para botar a produção de pé.
Belmonte considera o filme menos realista que a série, também dirigida por ele. “Decidi fazer uma grande alegoria. O filme tem um caráter mais simbólico.”
Esse viés alegórico mal aparece no livro. Existe um aspecto, porém, em que texto e filme se assemelham: o senso de responsabilidade demonstrado pelo carcereiro, encarregado de não deixar o preso fugir e de que ele siga vivo. “Na cadeia, voltei a perceber o valor da palavra. Se o carcereiro não cumpre a sua palavra, fica totalmente desmoralizado. Lá só resta a palavra”, diz Drauzio.
FONTE: FOLHAPRESS
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