SindusCon-SP estima 400 mil demissões no setor se for confirmada redução de 98% nas verbas do programa Casa Verde e Amarela
Os cortes no Casa Verde e Amarela devem paralisar até obras praticamente prontas destinadas à população de baixa renda, além de impedir novos contratos em curto prazo, afirmam profissionais do setor de construção civil.
Aos brasileiros com esse perfil que sonhavam ter uma casa própria em 2021 só resta torcer para o MDR (Ministério do Desenvolvimento Regional) conseguir convencer a equipe econômica do governo federal do impacto que o setor terá com o corte no Orçamento de 98% da verba destinada ao programa.
Entidades ligadas à construção civil apoiam o apelo do MDR porque veem na medida uma dificuldade extra, em plena pandemia de covid-19, a milhares de trabalhadores e empresas do segmento.
O presidente do SindusCon-SP (Sindicato da Construção Civil do Estado de São Paulo), Odair Senra, diz que o chamado Grupo 1 do programa Casa Verde e Amarela, destinado a pessoas que ganham até R$ 2 mil (com taxa de juros a partir de 4,25% ao ano), é o mais afetado, mas não o único.
Segundo ele, os cortes aprovados no Congresso Nacional reduziram em 98% os recursos do FAR (Fundo de Arrendamento Residencial), que subsidia habitações pela iniciativa privada às famílias de mais baixa renda do programa. “Em vez de R$ 1,54 bilhão, ficaram somente R$ 27 milhões.”
Também se cortou, conta Senra, 51% do FDS (Fundo de Desenvolvimento Social), que financia moradias a entidades sociais. Em vez de R$ 720 milhões, receberá R$ 350 milhões.
Senra afirma que, “concretamente, está ameaçada de paralisação a construção de 785 empreendimentos em todo o país, responsáveis por 215 mil unidades habitacionais”. Caso isso ocorra, 400 mil trabalhadores diretos e indiretos envolvidos com essas obras poderão perder o emprego.
Destes empreendimentos, 126 se localizam no Estado de São Paulo, com 28,4 mil unidades.
O presidente do SindusCon-SP admite que, mesmo antes do último corte, havia poucas ofertas no mercado para famílias com menos renda.
“Isso porque não havia verba para novas contratações no Orçamento de 2020. Assim, além de concluir as obras em andamento nesta faixa, o setor hoje está mais orientado para as faixas 2 e 3 do programa, com subsídios do FGTS”, explica.
Rodrigo Luna, vice-presidente de Habitação Econômica do Secovi-SP (Sindicato da Habitação de São Paulo), reforça que novos contratos nessa faixa são inimagináveis em curto prazo. “Essas pessoas já sofrem há algum tempo com uma redução significativa de ofertas e isso agora só tende a piorar.”
Luna diz que o segmento entende as dificuldades impostas pela pandemia, que exigiram do governo federal reduções em vários setores. “Somos solidários, mas sabemos que neste momento é preciso escolher bem onde fazer ajustes e como fazê-los.”
Para ele, habitação é um bem que poderia ter peso mais elevado em uma estratégia que olhassse a importância dessa conquista em famílias e comunidades mais pobres.
“O Minha Casa, Minha Vida, nome anterior do programa, obteve enorme sucesso e deu a possibilidade aos brasileiros de voltarem a sonhar com a casa própria. Desde 2009, quando foi criado, já entregou seis milhões de habitações, gera empregos, renda e movimenta a economia.”
A tendência, acredita o dirigente do Secovi-SP, é que as construtoras busquem outros nichos caso fique confirmada a redução do programa.
Uma saída, estimulada pelo isolamento social e o trabalho em home office, pode ser a reforma ou construção de propriedades para públicos com mais recursos.
A faixa menos privilegiada de brasileiros, que precisa de ajuda e subsídios públicos para voltar a pensar em uma casa própria, ficaria, portanto, à espera do retorno do programa social, explica o dirigente. Principalmente em um momento em que construir tornou-se ainda mais caro.
Luna argumenta que durante a pandemia construir ficou mais difícil no país. Os materiais vindos do exterior chegam com o preço elevado por causa da desvalorização do real. Outro fator que contribuiu para o encarecimento foi a procura aquecida e falta de produtos nas lojas devido ao aumento do número de reformas.
Ao mesmo tempo, protocolos de segurança contra a covid-19 tornaram mais demoradas as obras que tiveram recursos para sair do chão.
De acordo com o dirigente do Secovi-SP, correm risco todos os prédios e casas direcionados ao grupo 1 do Casa Verde e Amarela, mesmo os que têm um grupo de pessoas que já se preparava para entrar nesses imóveis.
Luna afirma que construções que parecem estar muito perto de ser entregues também podem ser interrompidas.
Isso porque a construtora saca mensalmente do ministério as verbas necessárias para tocar a obra. Logo, não é porque uma construção está em andamento que é certo que ela chegará ao final, no mesmo ritmo.
“Ela recebe do governo de acordo com o que ela entrega mês a mês. O cronograma de obra prevê determinado avanço mensal, aí, se ele for atingido, passa-se o restante do dinheiro.”
Em outras palavras, se ficar confirmado o corte de 98%, as empresas tiram suas equipes dos canteiros mesmo se faltarem apenas detalhes do acabamento.
“Claro que o valor que sobrar no programa, mesmo se forem só 2%, será usado em algum lugar. Aí cabe ao Ministério do Desenvolvimento Regional definir suas prioridades e onde pôr o dinheiro”, observa Rodrigo Luna. “Pode ser, por exemplo, que o ministério decida gastar os trocados que restarem na conclusão de obras quase prontas, mas isso a gente não tem como saber agora.”
A assessoria de imprensa do MDR explica que a pasta foca seus esforços no momento em convencer o Ministério da Economia e integrantes do governo federal sobre a importância de aumentar recursos para o Casa Verde e Amarela. E não há qualquer outro planejamento.
O advogado Vanderlei Garcia Júnior, especialista em direito imobiliário e professor do Meu Curso Inteligência Educacional, diz que pessoas que já têm a liberação do financiamento pelo banco e um contrato com previsão de entrega da construtora podem buscar seus direitos mesmo com o corte de verbas do programa habitacional.
“A lei protege esse cidadão. Se a construtora prometeu entregar a unidade em dezembro de 2021, por exemplo, ela tem no máximo 180 dias para dar as chaves ao proprietário.”
Garcia Júnior acrescenta que o consumidor precisa ter em mente que ele não está comprando um imóvel da Caixa Econômica Federal ou do governo, mas, sim, da construtora. E ela precisa ser acionada em razão de atrasos ou má qualidade da obra.
O advogado pede atenção redobrada às entregas que serão feitas à população de baixa renda a partir de agora, com a queda nas verbas do programa e a disparada dos preços da construção.
“A falta de recursos pode tornar as unidades ainda mais precárias. A gente vê que para essa faixa da população as casas não costumam ter o acabamento ou materiais similares aos de outras obras feitas pela mesma empresa. Por isso, é preciso exigir qualidade mais do que nunca”, adverte.
FONTE: R7.COM
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