Artistas estão apostando em versões ao vivo de suas músicas
Nego do Borel acaba de lançar seu disco mais ambicioso. “Sempre quis gravar um DVD desse”, diz. “É muito importante, um projeto com o qual sempre sonhei, com equipe profissional, participações.”
Ele está falando de “Ao Vivo”, registro em áudio e vídeo de seu show. Com investimento alto, é tido como o trabalho mais importante da carreira de Nego do Borel, que inclui hits de dimensões internacionais como “Você Partiu Meu Coração” e “Me Solta” (parceria com Rennan da Penha, indicada a um Grammy Latino).
Mas a aposta no formato não é exclusividade dele. Os dois últimos álbuns de Ferrugem, dos nomes mais populares do pagode atual, são registros de show. A mais tocada nas rádios do país neste semestre, “Milú”, de Gusttavo Lima, é também ao vivo. Gigantes do sertanejo, como Luan Santana e Marília Mendonça, também lançaram discos ao vivo neste ano.
Os dados do Spotify reforçam essa percepção. Segundo levantamento da Folha de S.Paulo, entre 51 países analisados, o Brasil é o que mais ouve música ao vivo.
Usando o algoritmo da plataforma, quase 7% das músicas brasileiras no Top 200 são ao vivo. O segundo lugar é o México, com 1,5%, sendo que a média no resto do mundo é 0,5%.
Se, em vez do algoritmo, for feita uma busca pelo termo “ao vivo” no Top 200 do Spotify, o número sobe para 30% das faixas no Brasil.
“A versão ao vivo costuma transmitir a atmosfera do show. Durante anos, o Brasil foi um dos poucos e maiores mercados na venda de DVDs. O brasileiro, historicamente, aprecia levar o show para sua casa”, analisa Renê Lavradas Júnior, diretor artístico da Sony.
Ao longo dos anos 2000, os DVDs foram parte importante do consumo de música. A mídia ficou tão consagrada que até hoje é comum chamar de DVD qualquer registro em vídeo de show –mesmo que ele nem seja lançado no formato.
É no YouTube que os artistas divulgam os vídeos atualmente. “Com a queda e o ‘fim’ das mídias físicas, surgiram também novos players para o consumidor ter acesso a vídeos longos”, diz Lavradas Júnior.
Ele se refere a outros serviços de streaming. Luan Santana, por exemplo, lançou seu disco-filme “Viva” com exclusividade no Globoplay, plataforma sob demanda da Globo.
“Não é algo recente. Mas, com a crescente do sertanejo, isso aumentou”, diz Guilherme Ferraz, produtor e compositor de nomes como Léo Magalhães e João Neto e Frederico. “Creio que seja um jeito de o artista parecer ‘grande’, com uma megaestrutura, público de 50 mil. Isso impressiona.”
Segundo o levantamento, 24% das faixas sertanejas entre as mais tocadas do Spotify são ao vivo. O número cai para 2,5% em músicas de outros gêneros.
No sertanejo, diz Ferraz, o recurso é tão estabelecido que muitas gravações são, na verdade, feitas em estúdio. “Hoje é comum, por uma questão de praticidade”, conta. “A captação de instrumentos ao vivo requer maior cuidado, dá muito trabalho. É muito mais barato gravar no estúdio e, com as ferramentas de mixagem que temos hoje, facilmente dá para soar como ao vivo.”
Só bateria, baixo e voz costumam ser gravados em shows. Musicalmente, o diferencial do ao vivo acaba sendo a captação do ambiente, que faz a música soar mais épica e grandiosa do que em estúdio.
“A música soa maior por causa do reverb [eco] natural e outros efeitos adicionados na mixagem” diz Ferraz. “A emoção é maior quando você escuta o som do público.”
Segundo Lavradas Júnior, há ainda a vontade de explorar o amplo mercado brasileiro de shows, que é maior no sertanejo. Lançar um single ou disco ao vivo acaba funcionando como promoção do show.
“Quando lança um DVD, você vende seu show –a presença de palco, o carisma”, diz Nego do Borel. “As pessoas se empolgam, querem ver pessoalmente. Agenda bomba, música bomba.”
Mais ligado ao funk, Nego do Borel é exemplo de que o ao vivo não é exclusividade do sertanejo. Para muitos artistas, o “DVD” –na verdade, disco-filme ao vivo– é sinônimo de carreira bem-sucedida. É um jeito de se vender como alguém estabelecido e respeitado, capaz de animar grandes plateias.
“Um DVD é um DVD”, diz o cantor. “Mesmo se não fizer o maior sucesso do mundo, considero como um presente de papai do céu, com tudo que já vivi e passei. É a comemoração da minha carreira, dos oito anos na rua fazendo show, do meu nome estar grande.”
FONTE: FOLHAPRESS
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