As perguntas que os engenheiros da Vale presos nesta terça-feira terão que responder à PF
Barragem avisa que vai romper. O nível de água sobe, ela se movimenta no espaço. Aparecem pequenas nascentes de água, trincas, insetos. Surge vegetação de porte na própria estrutura da barragem, isto é, no maciço. A barragem de disposição de minério de ferro B1 da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, que causou a maior tragédia da história da mineração no país, não recebia rejeitos desde 2015. Tinha altura de um prédio de nove andares e área equivalente a 32 campos de futebol. Como ninguém percebeu os sinais de que ela se partiria?
Sua instalação e operação começou na década de 70. Se tivesse sido hoje, os rejeitos decorrentes da atividade seriam secados e colocados como pilhas, jamais na forma como se fazia há 50 anos – permitindo o contato de rejeito fino e molhado direto com o maciço, isto é, com a estrutura que dá sustentação à barragem, que a constitui. Novas barragens usam tecnologia, têm monitoramento on-line e em real time. O único jeito de lidar com as antigas – caso de Brumadinho – é monitorar, colocar instrumentação moderna e antecipar os problemas. Quais eram e onde estavam os instrumentos que deveriam avisar sobre o risco de o pior acontecer?
A lei obriga empresas de mineração a fazer vistorias locais em cada uma de suas barragens, para monitorar segurança. De 15 em 15 dias ou de 30 em 30. Devem-se produzir relatos disso. Pelo menos uma vez por ano, exige-se uma auditoria interna mais ampla, que ainda deve ser confirmada por uma auditoria externa. Os dados precisam ser reportados à Agência Nacional de Mineração (ANM), cujos técnicos também estão obrigados a fiscalizar as barragens in loco , uma vez por ano. Em Minas, as empresas devem, ainda, cadastrar dados de cada barragem na Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) e informar regularmente condições de estabilidade e dados gerais. O que foi desconsiderado? Por que os relatórios não atestaram que a estrutura estava prestes a ruir?
O maior projeto de minério de ferro da história da Vale está em Canaã dos Carajás, no sudeste do Pará, e dispensa a necessidade de barragens de rejeitos, porque é realizado por método de extração a seco. Funciona no Pará porque lá o minério de ferro é de alto teor, isto é, basta explotar e pronto. Minério com baixo teor, como ocorre em Minas, exige a separação do ferro de demais minerais, como a sílica (areia). A forma de fazer isso é colocar água e um pouco de amido de milho (o amido separa o ferro da sílica). O que vai para a barragem? Areia e água. A água ainda é reaproveitada.
O licenciamento aprovado em dezembro do ano passado no Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam), por unanimidade, previa, na prática, o fim da Barragem B1. Prometia-se a retirada do material para tratamento e reaproveitamento econômico, gerando um produto comercializável e outro não comercializável. Segundo o projeto, o que não fosse comercializável seria disposto em pilhas secas, as mesmas citadas no início deste texto, mais seguras do que as barragens da própria B1, que seguia o modelo antigo. Passaram-se 45 dias entre a aprovação do projeto e o crime de Brumadinho. O processo de retirada de material havia começado? Foi o gatilho para o processo de liquefação da terra, do ônibus, da mata, do refeitório, da gente, de tudo?
FONTE: ÉPOCA
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