Responsáveis pela votação nos 50 estados americanos ouvidos pelo New York Times declararam que não há sinais de que os resultados foram adulterados
Funcionários de órgãos eleitorais de dezenas de estados, representando os dois maiores partidos dos EUA, afimaram não ter visto provas de que fraudes e outras irregularidades influenciaram os resultados da disputa pela Presidência, o que afasta os argumentos de Donald Trump de que essa foi uma eleição fraudulenta.
Nos últimos dias, o presidente, integrantes do governo, republicanos no Congresso e aliados de direita levaram adiante uma versão falsa de que a eleição foi roubada de Trump, e desde então se recusam a aceitar os resultados que mostram Joe Biden como o vencedor.
Mas responsáveis pelas eleições ao redor do país disseram, em entrevistas e declarações, que o processo foi um sucesso memorável, apesar do comparecimento recorde e das complicações ligadas à pandemia.
— Há uma grande capacidade humana para inventar coisas que não são verdadeiras sobre as eleições — disse Frank LaRose, republicano que atua como secretário de Estado de Ohio. — As teorias da conspiração e os rumores sobre todas essas coisas correm soltos. Por alguma razão, as eleições nutrem esse tipo de mitologia.
Steve Simon, secretário de Estado de Minnesota e ligado aos democratas, disse: “Não conheço um único caso de alguém afirmando que um voto foi contado quando nao deveria ou não foi contado quando deveria. Não houve fraude”.
“O Kansas não teve quaisquer problemas amplos e sistemáticos relacionados a fraude eleitoral, intimidação, irregularidades ou questões na hora do voto”, um porta voz de Scott Schwab, o secretário de Estado, republicano, declarou em e-mail na terça-feira. “Estamos bem satisfeitos como a forma como a eleição transcorreu até agora.”
O New York Times entrou em contato com os escritórios das principais autoridades eleitorais em cada um dos 50 estados na segunda e na terça-feira, para perguntar se eles suspeitavam ou tinham evidências de ilegalidades. As respostas vieram de 45 estados. Nos locais remanescentes, o jornal falou com funcionários dos governos ou encontrou declarações públicas dos secretários de Estado.
No Texas, não houve resposta. Mas uma porta-voz dos responsáveis pela eleição no condado de Harris, o maior do estado, afirmou que houve apenas incidentes pequenos e que houve uma “eleição bem tranquila”. Na terça, o vice-governador do Texas, Dan Patrick, aliado de Trump, anunciou um fundo de US$ 1 milhão para recompensar denúncias de fraude na votação.
Alguns locais relataram pequenos problemas comuns, que eles garantiram estar atuando para sanar: alguns casos de voto ilegal ou duplicado, falhas técnicas e erros de matemática. As autoridades estão fazendo suas próprias revisões da votação, um processo padrão para que os resultados sejam certificados.
Ao longo da apuração dos votos, republicanos em muitos estados se engajaram em um esforço para deslegitimar o sistema de votação dos EUA.
Em alguns casos, integrantes do próprio partido foram atacados por supostamente não fazer o suficiente para desmascarar uma suposta fraude. Na Geórgia, onde Biden lidera, dois senadores republicanos, Kelly Loeffler e David Perdue, que disputarão um segundo turno em janeiro, defenderam a renúncia do secretário de Estado, Brad Raffensperger, que é do mesmo partido deles: “O secretário de Estado fracassou na tarefa de entregar eleições honestas e transparentes”, os dois disseram em declaração.
Estratégia legal
Na segunda-feira, a campanha de Trump ampliou sua estratégia legal, dando início a um processo em sete condados da Pensilvânia onde o presidente perdeu, afirmando que a votação por correio criou um sistema injusto, com padrões duplos, durante a eleição — isso apesar de o mesmo sistema estar presente em condados onde o presidente venceu. Ainda há planos para uma outra ação no Michigan.
Trump ainda fez uma série de publicações no Twitter com acusações falsas sobre problemas em Nevada e na Pensilvânia, prevendo que ele vai vencer na Geórgia, onde está cerca de 15 mil votos atrás de Biden, e afirmou que o Wisconsin “precisa de um pouco mais de tempo”, sem explicar exatamente o que queria dizer com isso. O democrata foi declarado vencedor no estado.
Nellie Gorbea, a democrata que ocupa a Secretaria de Estado de Rhode Island, afirmou que a grande atenção sobre o processo eleitoral tornou ilegalidades na hora do voto muito difíceis.
— Seria quase impossível realizar qualquer tipo de fraude nesta eleição por conta do grande número de pessoas que a acompanhou — afirmou.
Ainda assim, Trump está obcecado com fraude eleitoral desde 2016, quando falsamente afirmou que um “roubo” de votos lhe custou a vitória no voto popular, que perdeu por cerca de 3 milhões de votos. Depois da eleição, ele criou uma comissão encarregada de buscar tais fraudes, mas ela suspendeu os trabalhos sem encontrar qualquer sinal de que houve irregularidades.
O ataque do presidente ao sistema eleitoral agora está baseado na fabricação de acusações ou exageros grotescos, ambos envolvendo os problemas típicos encontrados em todas as eleições.
Em Ohio, por exemplo, LaRose disse que, embora não seja estranho encontrar algumas impropriedades em uma eleição estadual, uma fraude sistêmica nunca ocorreu.
— No passado, houve casos de pessoas que votaram sem serem cidadãs — afirmou. — Mas isso são algumas dezenas de pessoas, não centenas. Não há um nível aceitável de fraude, e levamos todos esses casos a sério.
‘Risível’
A tensão sobre o voto foi mais palpável na Geórgia. A campanha de Trump e dois senadores republicanos reclamaram da transparência, algo que Raffensperger, o secretário de Estado, chamou de “risível”.
“Estamos literalmente colocando atualizações dos resultados ao menos uma vez por hora”, afirmou, em comunicado. “Eu e minha equipe realizamos briefings para a imprensa ao menos duas vezes por dia, com detalhes sobre os números. Então essa acusação específica é risível.”
Ele declarou ainda que, embora possa haver alguns casos pequenos de fraude, eles não deveriam alterar de forma significativa o resultado.
A ausência de sinais de fraude ou irregularidades, e a garantia de responsáveis locais pelas eleições, mesmo republicanos, de que houve uma operação tranquila minaram os esforços legais do presidente.
Em Michigan, a campanha de Trump afirmou que seus observadores não tiveram acesso aos locais de apuração. Mas os organizadores da eleição ali negaram, dizendo que dezenas de observadores das duas campanhas estavam no principal centro de contagem.
Na semana passada, um juiz negou um pedido para a suspensão da contagem, com base em reclamações sobre os observadores, rejeitando a principal prova como “vaga” ou “boato”. Por outro lado, acusações semelhantes são quase inexistentes em locais onde Trump e seus aliados foram bem nas urnas.
FONTE: O GLOBO
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