O Brasil é o terceiro maior produtor agrícola do mundo, sendo este um dos pilares da economia do país. Fazendo frente a esse fato, a Lei n° 14.130 de março de 2021 instituiu o Fundo de Investimento em Cadeias Agroindustriais (Fiagro), caracterizado pela junção de recursos de vários investidores para a aplicação em ativos de investimentos do agronegócio, sejam eles de natureza imobiliária rural, sejam de atividades relacionadas à produção do setor. Cabe ao administrador do fundo realizar a captação de recursos com os investidores por meio da venda de cotas.
Os rendimentos recebidos pelo Fiagro, obtidos com a venda ou locação de imóveis rurais, são distribuídos periodicamente aos cotistas. No caso da aplicação em títulos e valores mobiliários, o lucro se originará dos rendimentos distribuídos por esses ativos ou ainda pela diferença entre o preço de compra e de venda, isto é, o ganho de capital.
Para ilustrar melhor o funcionamento, um gestor ou instituição financeira é responsável pela decisão de onde investir os valores, sempre seguindo as políticas definidas pelo regulamento. Para participar dos fundos, os investidores adquirem cotas que, somadas, representam o patrimônio total. No Fiagro, os investimentos devem ser feitos em ativos do agronegócio.
De forma geral, o Fiagro pode investir em imóveis rurais; participação em sociedades que explorem atividades da cadeia produtiva agroindustrial; ativos financeiros, títulos de crédito ou valores mobiliários emitidos por pessoas físicas e jurídicas dentro da cadeia produtiva agroindustrial; direitos creditórios do agronegócio ou imobiliários relativos a imóveis rurais; e cotas de fundos de investimento que apliquem mais de 50% do patrimônio em ativos do agronegócio.
Apesar da possibilidade de investimento em diversos ativos, a lei aproximou o Fiagro dos Fundos de Investimento Imobiliário (FII), inclusive prevendo que os investidores pessoas físicas terão a mesma isenção dos investidores pessoas físicas dos FII. O Fiagro terá ainda uma vantagem tributária: ficará adiado o imposto de renda que seria aplicado sobre o ganho de capital na integralização de cotas do Fiagro, que ocorre com a transferência de imóvel rural por pessoa física ou jurídica. Esse recolhimento será apenas no momento de venda ou resgate das cotas.
Com a criação do Fiagro, os investidores têm uma nova alternativa para ingressar no agronegócio e aproveitar todo o potencial do setor. Até então, a maneira mais comum para isso era comprar ações de empresas listadas na bolsa ou títulos de renda fixa. As instituições financeiras que operam o crédito rural, por exemplo, podem criar um Fiagro para captar novos clientes interessados nessa área e aplicar recursos. O mesmo vale para as gestoras de fundos que operam no mercado financeiro. Assim, há alternativas para diversificar a carteira de clientes e ativos.
Um dos possíveis impactos do Fiagro no agronegócio é a adoção mais robusta da agenda de governança ambiental, social e corporativa (ESG), principalmente pela entrada de fundos de investimento no setor. Atualmente, o mercado financeiro coloca essa agenda como prioritária na decisão de como aplicar recursos. A tendência é que esses sejam direcionados, por exemplo, para as propriedades rurais ou empresas que estão em compliance socioambiental. A consequência será um fortalecimento da agenda no setor, tornando-se cada vez mais difícil se capitalizar sem ter esse cuidado socioambiental e uma forte governança corporativa.
Para falar um pouco sobre o administrador de um fundo de investimento, ele é a instituição que constitui o fundo e aprova, no mesmo ato, o regulamento, documento no qual são estabelecidos as regras de funcionamento do fundo, o objetivo e a política de investimento.
Podem ser administradores de fundos de investimento as pessoas jurídicas autorizadas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para o exercício profissional de administração de carteiras de valores mobiliários. Pelos seus serviços, ele é remunerado pela cobrança de uma taxa de administração, podendo, ainda, a depender da classe de fundo de investimento que administra, cobrar taxas de performance, de ingresso e de saída, nos termos da regulamentação.
O gestor da carteira, por sua vez, é a pessoa física ou jurídica responsável pelos investimentos realizados pelo fundo. É quem decide quais ativos financeiros irão compor a carteira, quando e quanto comprar ou vender de cada ativo, sempre observando as perspectivas de retorno, risco e liquidez, tendo em vista a política de investimento e os objetivos definidos no regulamento. O papel do gestor pode ser desempenhado pelo próprio administrador do fundo ou por terceiro contratado para a função, devendo ser credenciado junto à CVM.
De forma geral, o gestor deve receber o título de aprovação pela CVM, abrir uma empresa com CNPJ e razão social de administração de recursos, pedir autorização para a CVM para administrar recursos, entrar com o pedido junto à Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Anbima) para aderir ao código de melhores práticas de mercado, buscar um administrador e custodiante para o fundo e captar ou aportar o capital inicial. Somente a pessoa jurídica autorizada pela CVM para realizar administração de carteira pode ser administrador de um fundo de investimento.
Como dito anteriormente, merece destaque o fato de que o Fiagro, além de prever expressamente a integralização de imóveis, com recolhimento do imposto apenas na venda ou resgate das cotas, antecipa também a isenção de imposto de renda na distribuição de rendimentos à pessoa física, caso sejam cumpridos alguns requisitos. Os rendimentos distribuídos pelo Fiagro que possuam no mínimo 50 cotistas serão isentos se as cotas forem negociadas exclusivamente na bolsa de valores ou mercado de balcão organizado, desde que o cotista não seja titular de 10% ou mais do total emitido pelo fundo e desde que as cotas não tragam rendimento superior a 10% do total de rendimentos do fundo.
O Fiagro, dessa forma, passa a ser uma das formas disponíveis para o investimento em imóveis rurais. Para fins de tributação, caso cumpridos os requisitos para isenção da distribuição de rendimentos, o fundo se apresenta como uma estrutura interessante, quando comparado com as formas de exploração de imóveis rurais por meio de pessoa física ou jurídica.
Por outro lado, a integralização dos imóveis rurais dessa forma é uma sujeição ao regime jurídico dos fundos, ou seja, o titular original do imóvel deixa de ter a propriedade rural diretamente e passa a deter cotas do fundo. O fundo serviria como uma forma de gestão desse patrimônio, sendo administrado de acordo com regulamento próprio, por meio de uma instituição autorizada pela Comissão de Valores Mobiliários.
A estrutura, com os devidos ajustes, pode ser utilizada como uma modalidade ou alternativa para realizar um planejamento sucessório e organização das terras pelos grupos familiares, sendo que, neste caso, não há transferência direta de imóveis a herdeiros, mas sim das cotas do fundo. Existem outros aspectos jurídicos para a utilização do Fiagro para esta ou outras finalidades, razão pela qual é recomendável o acompanhamento por uma assessoria jurídica especializada, avaliando-se cuidadosamente o patrimônio e as peculiaridades de cada caso.
*Paulo Barretto é advogado atuante na área de direito empresarial do escritório Dosso Toledo Advogados. É pós-graduado em Direito Processual Civil Empresarial pela Faculdade de Direito de Franca (FDF) e pós-graduando em Falência e Recuperação de Empresas pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).
AUTOR: ASSESSORIA DOSSO & TOLEDOS ADVOGADOS COM INFORMAÇÕES TEXTO COMUNICAÇÃO COM COMUNIQUESE
FOTO CRÉDITO: AGROTOOLS |
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