Em busca e apreensão na sede da empreiteira, há três semanas, a PF encontrou um contrato confidencial de “consultoria”, fechado em 2010. Além dos comprovantes de pagamento a ele, logo após o contrato, a Camargo Corrêa firmou com a Petrobras dois contratos de serviços na refinaria Abreu e Lima, no valor de R$ 4,7 bilhões
Uma empresa do petista José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil, condenado por corrupção no escândalo do mensalão e político mais influente na Petrobras nos governos deLuiz Inácio Lula da Silva, recebeu R$ 886 mil da empreiteira Camargo Corrêa entre 2010 e 2011. Na época, ele já era réu no processo mensalão e exercia influência na Petrobras. No mesmo mês em que assinou o contrato com a empresa de Dirceu, a Camargo obteve dois contratos com a Petrobras para prestar serviços na refinaria Abreu e Lima. Os contratos somam R$ 4,7 bilhões e, segundo os depoimentos do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e do doleiro Alberto Youssef, foram fechados mediante pagamento de propina ao PT e ao PP. Embora negue, foi Dirceu quem indicou Renato Duque, então diretor de Serviços da estatal e responsável pelos contratos da Camargo, acusado por Costa, Youssef e por um empreiteiro de cobrar propina para o PT.
As provas da relação secreta entre Dirceu e a Camargo foram descobertas pela PF há três semanas, durante buscas na sede da Camargo. No mesmo dia, apelidado pelos investigadores de “Juízo Final”, houve buscas em outras oito empreiteiras, nas casas de executivos dessas empresas e em escritórios de lobistas. Na semana passada, ÉPOCA obteve acesso exclusivo à íntegra desses documentos. São milhares e milhares de páginas, que se somam às já dezenas de milhares de documentos apreendidos desde o começo da operação Lava Jato, em março. Elas expõem a relação promíscua entre as grandes empreiteiras do país e os políticos que detêm influência em estatais como a Petrobras. Reforçam, com fortes evidências, a acusação de que essas empreiteiras formavam um cartel para assegurar os maiores contratos da Petrobras. Apontam novos casos de corrupção em outros órgãos do governo – e até no exterior. Nos próximos dias, fundamentados em larga medida nesses documentos apreendidos, os procuradores da força-tarefa da Lava Jato denunciarão à Justiça os empreiteiros acusados de montar o cartel.
O contrato entre a Camargo e a empresa de Dirceu, chamada JD Assessoria, foi assinado em 21 de fevereiro de 2010. Não tinha um objeto claro. Previa apenas que Dirceu faria análise de “aspectos sociológicos e políticos do Brasil” e prestaria “assessoria na Integração dos países da América do Sul”. Dirceu também deveria, de acordo com o contrato, divulgar o nome da Camargo na comunidade nacional e internacional, além de fazer palestras e seminários em assuntos de interesse dela. O contrato é marcado como sigiloso. Dirceu deveria receber R$ 75 mil por mês. Durante dez meses, segundo os comprovantes encontrados, recebeu mesmo. Entre maio de 2010 e fevereiro de 2011, a JD faturou R$ 886.500 com base no contrato. O primeiro pagamento foi retroativo e abarcou três meses de “consultoria”.
Não se sabe por que um gigante como a Camargo precisava da capacidade de divulgação de Dirceu no Brasil e na América do Sul. Nem o valor de suas análises políticas e sociológicas. Sabe-se, porém, que Dirceu exercia forte influência na Petrobras, mesmo após deixar o governo Lula, no auge do mensalão, em 2005. Indicara Duque para a Diretoria de Serviços e mantinha petistas em cargos estratégicos da estatal. Sabe-se, também, que, no mesmo mês em que Dirceu assinou o contrato com a Camargo, o Consórcio CNCC, de que a Camargo faz parte, ganhou dois contratos para fazer “serviços de implantação de unidade de coqueamento” na refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. Eles somam R$ 4,7 bilhões. Com base nas evidências documentais e nos depoimentos de testemunhas e delatores, os procuradores e a Polícia Federal suspeitam que os contratos da Abreu e Lima tenham sido superfaturados e fechados à base de propina.
Por meio de sua assessoria, a JD afirma que ” prestou consultoria na área internacional à Camargo Corrêa, entre maio de 2010 e fevereiro de 2011”. “Por razões de confidencialidade contratual, a JDA não pode se manifestar sobre a natureza nem os resultados dos serviços prestados”, diz a assessoria da JD. A Camargo Corrêa confirmou a “existência do contrato”, mas não quis fazer comentário a respeito.
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