Prefeitura de Ariquemes (RO) diz que páginas com casais serão suprimidas.
MP-RO divulgou que decisão implicará a uma improbidade administrativa.
O Ministério Público de Rondônia (MP-RO) tornou público, nesta quarta-feira (25), os livros escolares que a prefeitura de Ariquemes (RO) proibiu de serem entregues aos alunos do ensino fundamental por ter diversidade familiar, como casamento e adoção de crianças por homossexuais. As páginas com estes conteúdos, conforme decisão anunciada nesta semana pelo prefeito Thiago Flores (PMDB), serão retiradas e uma comissão vai fiscalizar todo trabalho.
O G1 teve acesso aos conteúdos presentes nos livros didáticos e constatou a presença de questões relacionadas à diversidade sexual nas formações de famílias. Em um livro de geografia do 3º ano, o texto apresenta que as famílias podem ter diversas composições e apresenta uma foto com duas mães e as filhas.
Em um livro de história do 2º ano, uma imagem conta a história de Theodora. “Theodora e seus pais, Vasco e Dourival – o primeiro casal de união homoafetiva a adotar uma criança no Brasil, em 2006”.
Em um livro de geografia do 3° ano, o material indica a leitura ao aluno sobre um texto de um casal homossexual que adotou uma criança com necessidades especiais.
Já em um livro do 1º ano, um exercício leva aos alunos completar as legendas das fotografias escrevendo o número de pessoas de cada família. Entre as imagens, está a de uma família formada por dois pais e uma criança.
Para o MP-RO, a decisão acordada entre vereadores e o prefeito do município de retirar os conteúdos de diversidade sexual é absurda e ilegal. A não utilização desses livros incentivaria o preconceito e incitação ao ódio contra as pessoas homossexuais.
Conforme o MP, em nenhum momento os livros tratam de ideologia de gênero, e sim a diversidade familiar e que todos os exemplares dos livros foram analisados pelo órgão.
Segundo a promotora da área da educação e defesa dos direitos humanos, o material é lícito e não irá prejudicar no desenvolvimento de uma criança.
“De maneira bem sutil foi colocado em algumas páginas dos livros, uma foto de um casal gay que adotou uma criança. Isso para explicar aos alunos as diferentes famílias que hoje são formadas, e não existe fundamento jurídico para a Câmara de vereadores ou o prefeito quererem que esse material não seja aplicado”, explicou.
O MP expediu recomendação para que o prefeito não tome a decisão de retirar esse material das escolas. A promotora Joice Gushy Mota disse que caso aconteça a retirada de páginas ou a supressão desse conteúdo, seja de qualquer forma, irá se constituir um verdadeiro ato de improbidade administrativa e prejuízo ao erário público. Além de poder ser considerado também como abuso de poder.
“Quando se cogitou suprimir as páginas desses livros, consideramos a ideia absurda, esse conjunto de livros didáticos é agora patrimônio do município de Ariquemes. Esses livros foram adotados depois de estudos por técnicos de equipes pedagógicas e custou dinheiro público, a população pagou por isso”, exclamou.
Procurada pelo G1 nesta quarta-feira (25), a assessoria da prefeitura informou que não deve se pronunciar, por enquanto, sobre o caso.
Opinião do Sintero
Para os representantes do Sindicato dos Trabalhadores em Educação no Estado de Rondônia(Sintero), os livros que chegaram a ser distribuídos aos estudantes em 2016 e depois recolhidos, não discutem a chamada ideologia de gênero, a qual é uma teoria que afirma que a questão sexual é uma construção social e sim conteúdos de diversidade familiar. O tema está previsto na grade curricular como disciplina a ser abordada em conjunto com outras.
“O livro didático chega à escola através do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), onde passa por uma seleção de mestres e doutores do Ministério da Educação (MEC) e depois chega às redes públicas para ser selecionado pelas escolas”, explica o representante Alan Duarte.
Caso
No início do mês de janeiro, oito dos treze vereadores protocolaram um ofício para solicitar a suspensão e o recolhimento dos livros didáticos disponibilizados pelo Ministério da Educação (MEC) que serão distribuídos neste ano, a fim de evitar a discussão sobre ideologia de gênero nas escolas do município.
Em agosto de 2016, os livros com o conteúdo foram entregues às escolas, mas foram retirados dos alunos pelo município.
De acordo com um dos vereadores responsáveis pelo ofício, Amalec da Costa (PSDB), existe uma lei municipal em vigência a qual não permite a exposição de conteúdos com ideologia de gêneros aos alunos do ensino fundamental.
“Todos estes livros enviados pelo MEC vêm com conteúdo de formação de família por homossexuais, orientação sexual, uso de preservativo. Entretanto acreditamos que estes assuntos devem ser abordados pelos pais e não nas salas de aulas, principalmente, por lidar com crianças”, analisa.
Na segunda-feira (23), o prefeito de Ariquemes, Thiago Flores (PMDB), realizou uma reunião com 12 vereadores para debater sobre o assunto. Na ocasião eles decidiram retirar os trechos com ideologia de gênero e diversidade familiar dos livros.
Segundo o prefeito Thiago Flores, os livros são entregues pelo Ministério da Educação (MEC) a cada três anos e, após as páginas com ideologia de gênero serem suprimidas, o material será distribuído aos alunos em março.
“Embora as aulas iniciem no dia 6 de fevereiro, há um período em que os professores chamam de diagnóstico, onde todas as aulas são ministradas em o uso do livro didático. Uma comissão fiscalizará em cada instituição de ensino a supressão deste materiais, pois todos os livros já estão nas escolas”, comenta.
Repercussão
O deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) publicou, na página oficial do Facebook, um texto de repúdio contra a escolha dos vereadores e prefeito de Ariquemes (RO) em mandar retirar trechos de livros escolares sobre união homossexual e ideologia de gênero. No texto, o parlamentar pergunta se a sociedade está “voltando para época de inquisição” e relata que está estudando, junto com a assessoria, a melhor maneira de impedir tal “arbitrariedade”.
Horas depois da postagem, já na noite de terça-feira (24), o prefeito Thiago Flores (PMDB) rebateu a crítica do deputado Jean Wyllys na mesma rede social. “E ai pessoal!! Tô pensando aqui se respondo ao Jean Wyllys ou lavo a louça da minha pia… Ah! Decidi: vou lavar a louça”, postou o gestor.
Fonte: G1
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