Justiça

Lei de Cotas deve passar por revisão até fim do ano

Relatora, deputada Dandara Tonantzin (PT-MG), defende alterar legislação para ampliar o acesso e a permanência de estudantes negros em instituições de ensino. Segundo a parlamentar, norma ainda prejudica esses alunos nas disputas por vagas

Após completar 10 anos de vigência, a Lei de Cotas (12.711/12) será revisada neste segundo semestre. E tem relatora definida no Congresso: a deputada Dandara Tonantzin (PT-MG). A norma, de 2012, reserva 50% de matrículas em universidade e institutos federais a alunos que cursaram o ensino médio em escola pública, com renda familiar igual ou menor a 1,5 salário mínimo, e pessoas com deficiência e que se identificam como pretos, pardos ou indígenas. Um artigo da lei previa uma revisão da política de cotas em 2022, mas o governo Bolsonaro não levou adiante o processo de reavaliação.

“Não tivemos nenhum tipo de ação junto às instituições federais de ensino para promover levantamentos, diagnósticos”, explicou a parlamentar ao Correio. “No primeiro semestre, nos dedicamos a isso. O Ministério da Educação (MEC) fez um estudo de quantas universidades têm as bancas de heteroidentificação, qual é o formato dessas bancas, qual é a característica delas”.

Tonantzin considera esse item da Lei de Cotas fundamental. “Nós queremos que as bancas de heteroidentificação sejam um processo obrigatório — só duas universidades do Brasil não fazem — e não tem ainda nenhuma normativa jurídica, nenhuma lei, nenhuma portaria com relação às bancas. Elas combatem as fraudes e fazem de fato a política ser efetivada”, observa.

A relatora adianta que outra mudança em vista será considerar a nota antes do critério de cota. “Muitos estudantes passariam na ampla concorrência”,diz. “Quando se considera apenas a cota, ela vira o teto e não o ‘plus’. A cota é o complemento, é o ‘a mais’ para o estudante entrar”, distingue.

Outro ponto que a deputada considera importante reexaminar, no contexto da revisão da lei de cotas, são as condições oferecidas aos cotistas para que eles mantenham os estudos. “Nós queremos que todo cotista seja bolsista e, para isso, defendemos a prioridade nas bolsas de permanência e nas bolsas de assistência estudantil também para os cotistas”, acrescenta.

A deputada informa que foi encaminhado ao MEC o pedido de detalhamento dessa medida, contemplada no Plano Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes). “Eles estão finalizando esse estudo, porque queremos incluir uma emenda no Plano Plurianual (PPA) para garantir recurso para isso. Para nós, o Pnaes é tão importante quanto o Bolsa Família”, avalia Tonantzin.

Audiências públicas

Os avanços na política de cotas são tema de debate em audiências públicas realizadas em 14 universidades e institutos federais. Essas instituições discutiram com estudantes de todas as regiões do país quais melhorias poderiam ser acrescentadas na legislação. Em um esforço complementar, a Comissão de Educação da Câmara dos Deputados tem ouvido estudantes, gestores e parlamentares para finalizar “um pouco desse processo de escuta ativa que nós iniciamos ainda em fevereiro”, nas palavras da relatora da Lei de Cotas.

“Queremos reativar canais que foram esvaziados ao longo dos últimos seis anos — como o Comitê de Acompanhamento e a Comissão Permanente — para que tanto a sociedade civil quanto o governo tenham um espaço permanente de avaliação”, ressalta Dandara Tonantzin.

A permanência dos estudantes negros no ensino superior é desafiadora, seja pelos obstáculos socioeconômicos, seja pelo racismo. A relatora afirma que a aposta para enfrentar o problema está nas bolsas de permanência, moradia, transporte e alimentação, além disso, “nos programas de extensão, de pesquisa, também com recorte racial e como prioridade dos cotistas”.

Uma maneira indireta de combater o preconceito é valorizar a cultura africana e afro-brasileira, por meio da lei 10.639/2003. Essa norma determina o ensino da história africana e afro-brasileira no currículo das escolas. “Paralelo à revisão (das cotas), estamos também discutindo muito a implementação da lei 10.639. Passados 20 anos, pesquisas mostram que 70% da educação brasileira ainda não efetiva essa lei. Para nós, é uma chave para fortalecer a educação antirrascista”, pondera a deputada.

“(É importante) ter disciplinas de história africana, afro-brasileira, contribuição do nosso povo para construção do nosso país. Fazer do racismo um debate permanente nos processos didático-pedagógicos. Não dá para a gente achar que só vai debater racismo no mês de novembro. Acreditamos muito que tem de vir num movimento conjunto da educação antirracista”.

A relatora está confiante com o andamento dos debates, com o retorno do recesso parlamentar. “Percebo que os deputados e deputadas que realmente debatem ações afirmativas, inclusão, educação como direito, têm uma vivência, conhecem a escola, o chão da sala de aula”, avalia.

FONTE: CORREIO BRAZILEINSE

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