Mahsa Amini, de 22 anos, morreu após ser presa pela polícia da moral iraniana. Caso levou a protestos violentos no país, foi condenado pela comunidade internacional e reacendeu debate sobre hijab obrigatório.
A morte de Mahsa Amini, uma iraniana de 22 anos detida pela polícia da moral, gerou indignação no Irã e no mundo. Em protestos em todo o país, manifestantes criticaram o governo e entraram em confronto com forças de segurança, resultando em várias prisões. Líderes internacionais condenaram a morte e a repressão às manifestações que se seguiram.
No fim de semana, o presidente do Irã, Ebrahim Raisi, telefonou para os pais de Amini para expressar suas condolências e ordenou um inquérito sobre a morte, informou a agência de notícias estatal IRNA. “A filha de vocês era como minha filha”, teria dito o presidente. Mas nesta terça (20/09), as Nações Unidas exigiram uma investigação independente sobre o caso.
Nas redes sociais, a hashtag #MahsaAmini tem sido uma das mais compartilhadas desde o fim de semana. A possivelmente violenta morte da jovem iraniana também tem sido destaque em vários veículos de imprensa ao redor do mundo – do The New York Times e CNN nos Estados Unidos, ao India Today e o Japan Times no outro lado do globo.
Viagem com fim trágico
Mahsa Amini, da pequena cidade de Saghes, na província ocidental do Curdistão, havia viajado para Teerã com seu irmão no início da semana passada para visitar pontos turísticos da capital.
Por supostamente não usar o véu islâmico obrigatório sobre a cabeça, Amini foi presa pela polícia da moral iraniana por volta das 18h da terça-feira passada. Duas horas depois, ela foi levada a um hospital já sem vida. A polícia alega que a jovem desmaiou abruptamente.
Uma foto mostra Amini deitada, com os olhos negros inchados e a orelha sangrando. A imagem se espalhou rapidamente na internet, porque tocou numa ferida: a humilhação diária e o abuso sofrido por mulheres iranianas devido ao uso obrigatório do hijab.
Desde a Revolução Islâmica em 1979, as mulheres no Irã têm sido forçadas a se submeter a regras rigorosas que regulamentam exatamente como seu cabelo e o resto do corpo devem ser cobertos. Milhões de mulheres se opõem a isso, a maioria de forma silenciosa e discreta, mas nos últimos anos também publicamente. Muitas iranianas usam o lenço na cabeça com mais folga e o deixam cair sobre os ombros, sob o risco de serem presas.
O governo sob a presidência de Raisi e religiosos da linha dura no Parlamento vêm tentando, há meses, fazer com que as leis islâmicas sejam cumpridas com mais rigor.
Após a morte de Amini, uma série de vídeos voltou a circular nas redes sociais mostrando mulheres sendo espancadas e abusadas pela polícia quando são presas. As imagens frequentemente revelam golpes violentos na cabeça enquanto elas são arrastadas pelos cabelos para dentro de viaturas.
Amini foi oficialmente declarada morta na sexta-feira, apenas três dias após ter sido levada ao hospital. A polícia nega as alegações de tortura. A morte foi explicada como um “ataque cardíaco repentino”. Um vídeo transmitido pela televisão estatal iraniana mostra a jovem caindo de repente no chão, enquanto negociava sua libertação com os policiais. O pai de Amini garante que a filha não tinha problemas de saúde.
O hospital para onde Amini havia sido levada informou em uma declaração no Instagram no sábado que a paciente já registrava morte cerebral quando chegou à unidade na terça-feira. A declaração foi mais tarde apagada.
Investigação questionável
A imprensa estatal informou que a Justiça iraniana abriu um inquérito e que as investigações para determinar a causa exata da morte estavam em andamento. Enquanto isso, muitos iranianos se perguntam como essas apurações serão realizadas.
O corpo de Amini foi levado de volta à sua cidade natal pelas forças de segurança na sexta-feira à noite, sem um exame post-mortem, e foi enterrado na manhã de sábado.
Enquanto isso, os serviços de internet móvel estão sendo interrompidos em massa, relatam os jornalistas em Saghes. É difícil compartilhar fotos ou vídeos nas redes.
Foi no dia do enterro que eclodiram os primeiros protestos na província do Curdistão – que seguiram inflamados nos dias seguintes.
Durante o funeral, milhares se manifestaram em frente ao gabinete do governador, onde também houve confrontos com as forças de segurança, segundo a agência de notícias Fars. A polícia chegou a usar gás lacrimogêneo para dispersar a multidão.
Forças de segurança também intervieram em manifestações em Sanandash, capital do Curdistão, na noite de domingo, quando tiros de advertência teriam sido disparados. Houve vários feridos, e uma organização curda de direitos humanos relatou a morte de quatro pessoas. Em solidariedade, os comerciantes do Curdistão fecharam suas lojas na segunda-feira.
À tarde, milhares foram para as ruas de Teerã para expressar sua raiva e tristeza, entoando a frase “morte ao ditador”. Os policiais tentaram dispersar a multidão usando canhões de água e bastões. Alguns manifestantes também foram presos, informou a Fars.
Vários iranianos saíram às ruas em outras cidades do país, com numerosos vídeos sendo compartilhados na internet. Eles mostram confrontos violentos entre forças de segurança e manifestantes.
As mulheres estão expressando sua solidariedade também de outra maneira. Em protesto contra a repressão feminina, iranianas – algumas delas personalidades conhecidas – têm cortado o cabelo e compartilhado vídeos e fotos nas redes. Algumas queimaram seus véus.
Consternação internacional
A morte de Amini gerou indignação não apenas no Irã, mas também além das fronteiras. Um porta-voz do chefe da diplomacia da União Europeia (UE), Josep Borrell, pediu que os responsáveis pela morte sejam punidos e que os direitos fundamentais de todas as pessoas no Irã – incluindo os prisioneiros – sejam protegidos.
Os Estados Unidos, que tentam reviver o acordo nuclear de 2015 com o Irã, também condenaram a morte e pediram à República Islâmica que ponha fim à “perseguição sistemática” das mulheres.
A alta comissária interina das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Nada Al-Nashif, expressou nesta terça-feira sua preocupação com a morte de Amini e com a reação violenta das forças de segurança iranianas às manifestações que se seguiram.
“A trágica morte de Mahsa Amini e as alegações de tortura e maus-tratos devem ser investigadas com rapidez, imparcialidade e eficácia”, afirmou.
A ONG Human Rights Watch pediu a abolição da polícia da moral e das leis de base religiosa, como aquelas sobre o uso adequado de lenços na cabeça.
FONTE: DEUTCHE WELLE
Add Comment