Construtora Camargo Corrêa forneceu provas que possibilitaram apuração.
Entre investigados está o ex-presidente da Valec, Juquinha das Neves.
O esquema de fraudes em construção de ferrovias, apurado pela operação “O Recebedor”, deflagrada em conjunto pela Polícia Federal e Ministério Público Federal em Goiás (MPF-GO), nesta sexta-feira (26), foi descoberto após um acordo de leniência firmado com a construtora Camargo Corrêa.
De acordo com o procurador da República Hélio Telho, a construtora simulava contratos com a Elccon Engenharia, Evolução Tecnologia e com o escritório de advocacia Heli Dourado, que utilizava dinheiro de propina para fazer a defesa do ex-presidente da Valec Engenharia, Construções e Ferrovias (empresa estatal ferroviária ligada ao Ministério dos Transportes) José Francisco das Neves, conhecido como Juquinha das Neves.
Ele foi preso em julho de 2012 na Operação Trem Pagador, suspeito por lavagem de dinheiro público e enriquecimento ilícito e responde a processos junto ao Tribunal de Contas da União e à Justiça.
Ainda segundo Telho, a Camargo Corrêa afirmou ter pago R$ 800 mil em propina à Juquinha das Neves. “A partir das provas que a construtora apresentou, nós tivemos acesso à quebra do sigilo fiscal de outras companhias e identificamos o pagamento para três empresas, que teriam sido utilizadas para o pagamento da propina”, destacou.
Acordo de leniência é aquele em que uma empresa envolvida em algum tipo de ilegalidade denuncia o esquema e se compromete a auxiliar um órgão público na investigação. Em troca, pode receber benefícios, como redução de pena e até isenção do pagamento de multa.
O delegado Ramon Menezes, presidente do inquérito junto à PF, destacou que os prejuízos aos cofres públicos, apenas em relação aos desvios na construção do trecho da Ferrovia Norte-Sul, em Goiás, passam de R$ 600 milhões. “Nós temos alguns inquéritos em andamento e outros encerrados, que apuraram o superfaturamento das obras da Norte-Sul, em média de 600 milhões”, destacou.
Para Menezes, Juquinha das Neves recebeu muito mais propina do que o valor destacado pela Camargo Corrêa. “Certamente o valor de R$ 800 mil é irrisório diante de toda a possibilidade, já que identificamos um patrimônio da família do Juquinha de R$ 60 milhões”, disse.
(Foto: Reprodução TV Anhanguera)
O ex-presidente da Valec presta depoimento na sede da PF em Goiânia, desde o início desta manhã, após o cumprimento de um mandado de busca e apreensão e condução coercitiva.
O G1 entrou em contato com o escritório de advogacia que representa Juquinha das Neves, por volta das 9h, e aguarda um retorno.
Já a Camargo Corrêa informou, em nota, que “em razão da compulsória confidencialidade do Acordo de Leniência com o MPF, a Construtora Camargo Corrêa não pode se pronunciar”.
A reportagem tenta contato com a Elccon Engenharia, Evolução Tecnologia e com o escritório de advocacia Heli Dourado.
Operação ‘O Recebedor’
A operação foi deflagrada na manhã desta sexta-feira em Goiás, Paraná, Maranhão, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Distrito Federal. Ao todo, são cumpridos sete mandados de condução coercitiva e 44 de busca e apreensão no país. Destes, sete mandados foram em Goiás, sendo que três ainda estavam sendo cumpridos por volta das 11h.
Segundo o MPF-GO, o objetivo da operação é o de recolher provas sobre o pagamento de proprina para a construção das Ferrovias Norte-Sul e Integração Leste-Oeste, bem como prática de cartel, lavagem de dinheiro e superfaturamento.
Além de Juquinha das Neves, também foram conduzidos coercivamente à sede da PF a esposa e um filho dele e um sócio de um dos escritórios de advocacia.
Ferrovia Norte-Sul
A Ferrovia Norte-Sul foi inaugurada no dia 22 de maio de 2014, depois de cerca de 25 anos do início das obras. O trecho entre Palmas, no Tocantins, e Anápolis, em Goiás, tem 855 quilômetros de trilhos.
Apesar da inauguração, a primeira viagem só foi feita em dezembro do ano passado. Devido à demora da obra, a Valec não soube precisar quanto de dinheiro já havia sido gasto. A estatal estimou, na época, a quantia de US$ 8 milhões. Denúncias de irregularidades marcaram a construção.
Em novembro, o MPF-GO ofereceu denúncia contra oito pessoas suspeitas de superfaturar obras da Ferrovia Norte-Sul em Goiás. Todos eles devem responder por peculato e, se condenados, podem pegar até 12 anos de prisão.
O prejuízo com cargas que deixaram de ser transportadas, perdas e impostos não arrecadados pode chegar a US$ 12 bilhões por ano, segundo a Valec.
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