Decisão foi tomada após STF suspender depoimento do ex-governador. Prazo de 180 dias só voltará a ser contado após STJ acatar denúncia contra Witzel. Ele é acusado de participar de esquema de desvio de verbas de hospitais de campanha.
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) suspendeu nesta segunda-feira (28) os prazos do processo de impeachment de Wilson Witzel, governador afastado do RJ. Com isso, não há data para que o julgamento seja encerrado.
Inicialmente, o prazo era de 180 dias a partir de 5 de novembro, quando o processo de impeachment foi retomado no Tribunal Especial Misto. Porém, o depoimento de Witzel foi suspenso no sábado (26) por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal.
Ele determinou que o interrogatório somente poderá ser realizado após a defesa ter acesso a todos os documentos de defesa — como a delação premiada do ex-secretário Edmar Santos.
Assim, não há previsão de data para o depoimento do governador afastado.
Nesta segunda, o presidente do TJRJ, Cláudio de Mello Tavares, anunciou que suspendeu os prazos do julgamento.
A decisão estabelece que os prazos só serão retomados depois que o Superior Tribunal de Justiça acatar a denúncia contra Witzel que deu origem ao processo de impeachment. Como ele tem foro privilegiado, sua participação depende do aval do STJ.
A acusação do Tribunal, representada pelo deputado Luiz Paulo Corrêa da Rocha, afirmou que entrou com um pedido para impugnar a decisão e permitir o interrogatório do governador afastado.
Testemunhas
Nesta segunda, quatro testemunhas prestaram depoimento ao Tribunal Especial Misto.
A ex-subsecretária estadual de Saúde Mariana Tomasi Scardua afirmou que alertou sobre a escolha da Organização Social Iabas para a gestão dos hospitais de campanha. Mariana acabou exonerada logo depois.
Em depoimento, Mariana afirmou que, após externar que escolher a Iabas seria “imprudente e perigoso”, foi demitida do cargo.
De sete hospitais prometidos, apenas dois foram entregues, no Maracanã e em São Gonçalo, com capacidade reduzida, de acordo com o ex-secretário de Saúde, Alex Bousquet.
“Quando houve o planejamento, nós tínhamos um cenário catastrófico previsto em janeiro. O cenário dizia que nós precisaríamos de 5 mil leitos de CTI por mês por causa do percentual da população que seria atingida pelo coronavírus”, disse Bousquet.
Ambos foram posteriormente desmobilizados durante a gestão dele, que afirmou que, naquele momento, havia leitos físicos para suprir a demanda dos pacientes.
Ele avalia que o Estado do Rio ainda passa pela primeira onda da pandemia da Covid-19, e alertou:
“Acredito que ainda vamos aumentar o número de casos”
“Quando fui comunicada que os hospitais de campanha estavam sendo com o Iabas, fui novamente ao secretário e alertei a ele [Edmar Santos] que a Iabas tinha o histórico de não entregar o que prometia. Quando eu faço um novo alerta ao secretário sobre o Iabas, no dia 2 de abril, fui comunicada que seria exonerada no dia seguinte, dia 3 de abril”, explicou.
Mariana ainda negou os termos da delação de Edson Torres, que citam seu nome como possível beneficiária de recursos retirados do esquema de corrupção na área de saúde.
A sessão começou às 9h15 desta segunda-feira (28), com testemunhas arroladas pela defesa do ex-juiz federal.Os advogados de Witzel chamaram ainda o ex-secretário de Saúde do Rio Alex Bousquet e o ex-secretário de Defesa Civil e Corpo de Bombeiros, Roberto Robadey.
O Tribunal Misto pediu ainda o depoimento de duas outras testemunhas, que serão ouvidas assim que forem encontradas.
A sessão começou com os membros do tribunal respeitando um minuto de silêncio em homenagem à juiza Viviane Vieira do Amaral Arronenzi do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ). Ela foi assassinada na véspera de natal pelo ex-marido. O caso é investigado pela Delegacia de Homicídios da Capital.
Após o presidente do Tribunal, Claudio de Mello Tavares, repetir os termos da decisão do STF, o deputado que funciona como advogado de acusação no tribunal misto, Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB), afirmou que pediu no STF a impugnação da liminar que impede a oitiva de Wilson Witzel.
Testemunhas
Por volta das 9h35, o ex-assessor especial da subsecretaria de gestão da Atenção Integral à Saúde, Luiz Octávio Martins Mendonça, começou a ser ouvido. Ele disse que trabalhou com Mariana Scardua, ex-subsecretária na pasta, e que se especializou em contratações na área do Sistema Único de Saúde.
Mendonça avaliou que a entrada de Gabriell Neves, ex-subsecretário de Saúde, piorou muito as condições de trabalho na pasta de Saúde.
“Houve atraso no pagamento de salários, atraso no pagamento de fornecedores. E tive um desentendimento pessoal, então pedi para ser exonerado da secretaria de Saúde. Com o cenário pandêmico, decidi continuar, só que no dia 3 de abril minha exoneração foi publicada, junto com a exoneração da doutora Mariana Scardua”, afirmou.
Mendonça disse que, durante o tempo na secretaria, houve três Organizações Sociais que responderam por processos de desqualificação. A Unir Saúde, que foi desqualificada e depois requalificada para gestão de UPAs no Estado, estava entre elas. “A OS Pró-Saúde também respondia a um processo de desqualificação, assim como a Cruz Vermelha”, afirmou.
Segundo ele, até então nenhuma OS havia sido desqualificada, “embora houvesse Organizações Sociais que tivessem tido problemas de execução, tanto assistencial quanto à prestação de contas, no âmbito da execução desses contratos”.
Mendonça disse que nunca presenciou um ato irregular ou de corrupção na secretaria de saúde, e que acreditava que não havia desvio de verbas. “Nunca participei, nunca presenciei e nunca senti nada”.
Pouco antes das 11h30, começou o depoimento de Mariana Tomasi Scardua, ex-subsecretária de Gestão e Atenção Integral à Saúde durante a gestão de Edmar Santos.
Mariana disse que, com a chegada de Gabriell Neves como subsecretário executivo, o termo de compra de respiradores para ajudar contra a pandemia da Covid-19 não passou pela consulta de sua pasta. No entanto, não soube dizer quem pode ter indicado Neves para assumir o cargo.
A relação da pasta de Mariana com as unidades de saúde, segundo ela, piorou muito com a chegada de Neves.
“Até dia 31 de janeiro de 2020, o que perguntávamos à subsecretaria executiva era respondido claramente. Com a chegada do Gabriell Neves, os membros foram proibidos de conversar com outras áreas, e essas informações eram sempre imprecisas. Ficávamos com o prestador do lado dizendo que não recebeu e a secretaria de outro dizendo que pagou”, explicou Mariana, dizendo que o desgaste motivou seu pedido de exoneração.
Combate à pandemia
Às 13h05, começou o depoimento do coronel Roberto Robadey, ex-comandante do Corpo de Bombeiros e ex-Secretário de Defesa Civil. Ele afirmou que considerou acertada a decisão de criação de hospitais de campanha no Estado, e defendeu os planos de contenção da Covid-19 no Estado.
“Nós tínhamos um estudo no início da pandemia com uma projeção de que se nada fosse feito, a cada 7 dias o número de óbitos dobraria. Em certos momentos, havia um movimento grande pela liberação. Não fossem as reuniões, nós teríamos tido um caos no estado do Rio”, afirmou o coronel, que acrescentou que a secretaria chegou a estudar a compra de caixões e câmaras frigoríficas caso o número de mortos fosse muito grande no Estado.
Segundo ele, uma câmara foi levada para a Baixada Fluminense, mas nunca utilizada. A contratação de outros cinco equipamentos semelhantes não foi levada à frente.
Ex-secretário fala sobre OSs
Pouco antes das 13h50, começou o depoimento de Alex Bousquet, que foi secretário de Saúde após a saída de Fernando Ferry. Ele afirmou que, quando assumiu, viu uma secretaria “arrasada”.
“Vínhamos de prisões em sequência e um modelo de gestão do doutor Fernando Ferry para que a máquina ficasse ainda mais paralisada”, explicou.
Um dos três grupos de trabalho feitos por Bousquet após assumir o cargo foi para, segundo ele, dar respostas sobre os hospitais de campanha criados pelo Estado no combate à pandemia da Covid-19.
“Entendíamos que, em 22 de junho, o fortalecimento dos municípios seria fundamental para o enfrentamento à pandemia. Mapeamos mais de 900 leitos no momento em que optei pelo fechamento dos hospitais de campanha”, disse ele.
Bousquet afirma que o modelo de Organizações Sociais foi se “desvirtuando” no caminho, e citou que “40 ou 41” contratos estavam vigentes no seu mandato como secretário, com 11 OSs diferentes.
“Somente duas delas tinham nota B, de acordo com a nossa fiscalização. Todas as demais tinham nota C. Elas tinham dificuldade de cumprir as metas assistenciais, e as metas financeiras não eram fiscalizadas há muito tempo”
O ex-secretário de Saúde, que deixou o cargo após sofrer um mal súbito, disse que apurações sobre contratos de OSs foram feitos durante sua gestão, mas nenhuma investigação foi concluída.
Depoimento suspenso
O tribunal tinha estipulado o depoimento do governador afastado, Wilson Witzel, nesta segunda-feira (28). No entanto, a oitiva foi suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
No sábado (26), o ministro Alexandre de Moraes determinou que o interrogatório somente poderá ser realizado após a defesa ter acesso a todos os documentos de defesa — como a delação premiada do ex-secretário Edmar Santos.
Moraes estabeleceu ainda que o próprio Edmar terá que ser ouvido de novo após o fim do sigilo de sua delação, antes de Witzel. Assim, não há previsão de data para o depoimento do governador afastado.
Em agosto, Witzel foi afastado e denunciado pela Procuradoria-Geral da República por suspeita de corrupção. Segundo as investigações, ele seria o chefe de uma organização criminosa que teria desviado recursos públicos da área de saúde durante a pandemia.
FONTE: G1.COM – GLOBO.COM
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