Pesquisas do Polo Técnico, Científico e Inovação, que se dedica ao estudo de medicamentos ou insumos para diagnósticos, renderão dinheiro a Rondônia, prevê o diretor adjunto do Centro de Pesquisa em Medicina Tropical (Cepem), professor doutor Mauro Tada.
Aos 33 anos, Rondônia caminha para se tornar referência nacional e internacional em saúde humana, por contemplar doenças negligenciadas – aquelas que não recebem a devida atenção de grandes laboratórios ou instituições.
Em hepatites virais, a hepatite D (ou delta), causada pelo vírus D (VHD) é intensamente estudada in house (em casa) por cientistas de diversas instituições brasileiras. “No entanto, sua projeção máxima é hoje dada pela Fiocruz, nos laboratórios do Cepem/Sesau e Cemetron”, enfatizou o cientista.
Sesau é a sigla da Secretaria Estadual de Saúde e Cemetron, do Centro de Medicina Tropical de Rondônia. Sessenta dos mais de 90 profissionais em nível superior trabalham no Polo Fiocruz-RO. No quadro há 19 doutores, 40 mestres, médicos, biólogos, biomédicos e farmacêuticos bioquímicos.
Acre e Rondônia detêm exclusividade em hepatite D. O vírus dessa doença é dependente da presença do vírus do tipo B para infectar uma pessoa. Segundo Tada, os resultados das pesquisas certamente irão influenciar políticas públicas.
Da mesma forma que o vírus B, a transmissão da hepetatite D ocorre por relações sexuais sem camisinha com pessoa infectada; da mãe infectada para o filho durante a gestação, o parto ou a amamentação; compartilhamento de material para uso de drogas (seringas, agulhas, cachimbos, etc), de higiene pessoal (lâminas de barbear e depilar, escovas de dente, alicates de unha ou outros objetos que furam ou cortam) ou de confecção de tatuagem e colocação de piercings; por transfusão de sangue infectado.
A base do polo possibilita atualmente a formação de pesquisadores na região norte brasileira, e eles atuam em várias áreas da saúde humana e animal. Além da Fiocruz-RO, fazem parte do polo a Universidade Federal de Rondônia (Unir), o Cepem-Sesau e o Instituto de Pesquisas em Patologias Tropicais de Rondônia (Ipepatro).
Na gestão do ex-ministro da Saúde José Gomes Temporão, a Fiocruz-RO incorporou em 2009 várias atividades do atual Ipepatro, lembrou o diretor do Cepem, biólogo doutor Ricardo de Godói Mattos Ferreira.
Brevemente, essas instituições desfrutarão da sede própria na rodovia BR-364, projetada pelo arquiteto Oscar Niemeyer. Ele contemplou Rondônia por intermédio do cientista e professor Luiz Hildebrando Pereira da Silva. Os dois são falecidos. “Ambos premiam nosso estado”, elogiou Tada.
A planta avaliada em R$ 75 milhões será financiada em grande parte pela Finep Inovação e Pesquisa, com adição dos laboratórios onde a Fiocruz-RO albergará todas as instituições participantes colaboradoras, em parte por recursos humanos, ou como co-financiadoras.
O estudo de doenças negligenciadas congrega instituições que trabalham com seres humanos, plantas e animais. “O Cepem se responsabiliza por ensaios clínicos; a Unir pela formação de pessoal; a Fiocruz-RO, apoiada pelo governo estadual, projeta as descobertas”, explicou Ferreira.
“Laboratórios pararam de fabricar insumos para diagnóstico do vírus D, alegando falta de retorno financeiro”, lamentou Tada.
Pesquisada há décadas, a malária ainda não tem vacina. Nos anos 1970-80 do século passado, na chegada da grande corrente migratória ao velho Território Federal de Rondônia, esses municípios assemelhavam-se com países africanos, exibindo índices muito altos da doença que ainda infesta a Amazônia Ocidental Brasileira.
Nas décadas de 1960, 70 e 80 em Rondônia, homens, mulheres e crianças enfrentaram a doença com recursos estritamente locais, ingerindo drogas à base de quinino. Muitos morreram. A doença espalhou-se por todo o estado. Atualmente, 80% da malária de Rondônia ocorrem na capital, Porto Velho, e Candeias do Jamari, às margens da rodovia BR-364.
ASSINTOMÁTICOS
Tada enfrentou adversidades ao longo dos anos, decorrentes principalmente do clima rondoniense, estado diferente de outras regiões brasileiras, pois tem áreas de Cerrado, Floresta Amazônica e Pantanal (Vale do Guaporé).
Depois de tantas verificações in loco para tratar da epidemiologia das doenças com a equipe da Fiocruz Rondônia, ele ainda estimula companheiros e alunos, porém, adverte: “Se a pesquisa for interrompida por falta de recursos, está derrotada”.
O cientista lembra resultados eficazes de pesquisa feita em algumas comunidades isoladas, na faixa etária entre 30 e 35 anos, nas imediações da antiga Cachoeira do Teotônio, Candelária e Porto Chuelo, todas em Porto Velho. “Suspeitos servem de reservatório”, ele trata em sua tese.
Essas pessoas tiveram o parasita da malária, mas não desenvolveram a doença. “São assintomáticas”, explicou. “Quando jovens, pegaram muitas vezes a malária, por isso seu organismo não mais desenvolveu sintomas”.
Em se tratando de doenças negligenciadas, pesquisadores não se restringem ao básico. “Pensamos sempre no que entregar à sociedade”, explicou Tada. Aos governos federal e estadual, ele apela no sentido de tratar assintomáticos, ao se constatar a condição de malária residual (quando todas as medidas de controle conhecidas não conseguem mais diminuir a incidência) que são considerados “reservatórios de transmissão”: “O mosquito anofelino pica o indivíduo doente e passa o parasita para uma pessoa sadia que desenvolve os sintomas”.
GRATIDÃO
“Evoluímos o nosso projeto executivo em 2014”, comentou Ferreira. Ele destaca a liberação de recursos do Finep para o convênio Ipepatro-Fiocruz; o apoio da Secretaria Estadual de Planejamento, do Departamento de Obras e Serviços Públicos do Estado de Rondônia e da deputada federal Marinha Raupp (PMDB-RO).
Primeiro doutor com título de Rondônia, dos tempos em que a ciência ainda não obtinha mínimos financiamentos, Tada (UnB) homenageia pioneiros. Entre outros, manifesta gratidão aos cientistas Juan Miguel Villa Lobos Salcedo (Unir), Emery Camargo (USP), Luiz Hildebrando Pereira, in memoriam (Ipepatro), Luís Marcelo Aranha Camargo (diretor do Centro Avançado de Pesquisa-ICB em Monte Negro), Marcelo Urbano (USP), Henrique Krieger (USP).
Após a vinda do Pronúcleo de Excelência (Pronex) da USP nos anos 1990, a Unir criou pós-graduação e alguns alunos viraram professores nessa instituição. Nela já se formaram aproximadamente 150 mestres e 30 doutores. A conhecida “massa crítica estadual” foi um sonho do pesquisador Luiz Hildebrando.
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