Executivos entidade, que representa os moinhos brasileiros, veem influência não apenas do cereal, mas também da farinha do país vizinho.
A produção de trigo da Argentina pressiona o mercado brasileiro, influenciando o quadro de oferta e demanda e os preços. Para executivos da Abitrigo, associação que representa os moinhos do Brasil, com a produção maior, a exemplo do que ocorreu na temporada passada, os argentinos ganham em competitividade no cereal e também na farinha.
Na safra 2016/2017, os argentinos plantaram 6,36 milhões de hectares de acordo com dados oficiais. A colheita foi estimada em 18,39 milhões de toneladas, superando em mais de 62% a anterior (11,3 milhões de toneladas). A lavoura 2017/2018 já foi semeada. O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) e consultorias privadas estimam 17,5 milhões de toneladas, repetindo o número para o ciclo anterior, menos otimista que o do governo argentino.
“A Argentina tende a ficar mais influente no mercado brasileiro. E está havendo pressão também da farinha de trigo da Argentina, muito competitiva. Vai ser uma ameaça”, explica o presidente do Conselho Deliberativo da Abitrigo, Marcelo Vosnika.
Se a farinha argentina preocupa, o cereal usado como matéria-prima é visto como vantagem. Vosnika não esconde que, neste momento, a preferência da indústria brasileira tem sido pelo grão de fora do país. A queda do dólar favorece as importações e a maior oferta dos argentinos chega com preços mais baixos que os nacionais.
O executivo da Abitrigo explica que um terço da produção argentina abastece o Mercosul. Outro terço, os argentinos fornecem para regiões como o norte da África e Oriente Médio. Mas, nesses locais, o país deve enfrentar a concorrência com o trigo russo, cuja safra também está crescendo.
“Os argentinos vão ficar meio que sem saída e vai ter pressão de preços. O trigo importado está mais em conta por causa do dólar e da Argentina. Se tomarmos São Paulo como referência, é possível dizer hoje que o trigo do Paraná chega mais caro que o argentino”, afirma o presidente do Conselho da Abitrigo.
De janeiro a agosto deste ano, as importações brasileiras de trigo somaram 4,247 milhões de toneladas, de acordo com dados do sistema Aliceweb, do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC). O volume representa quase 61% de tudo o que a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) estima para a importação em 2017: 7 mil toneladas.
O trigo importado nos oito primeiros meses de 2017 é o maior volume dos últimos quatro anos, conforme levantamento da Globo Rural, também com base em dados oficiais. Corresponde também a quase 37% do volume a ser utilizado na moagem industrial neste ano, estimada pela própria Abitrigo neste ano, em torno de 11,5 milhões de toneladas, pouco acima do previsto pela Conab (11,2 milhões).
Na visão da entidade, o Brasil deve importar mais trigo que em 2016. Além da oferta do exterior estar mais vantajosa, a produção interna deve ser menor. Para a Conab, a área plantada é 9,5% inferior, de 1,91 milhão de hectares. A colheita deve cair 22,9%, para 5,18 milhões de toneladas.
A indústria de trigo espera ao menos estabilidade no consumo de farinha este ano. Depois de registrar um crescimento de 6,2% em 2016, a demanda pelo principal derivado do cereal deve se manter níveis semelhantes à demanda do ano passado, em torno de 8,2 milhões de toneladas, acredita a associação que representa os moinhos brasileiro.
“Com a melhora da economia, o mercado deve pelo menos se manter ou crescer”, avalia o presidente da Abitrigo, embaixador Rubens Barbosa, que concedeu entrevista, nesta quinta-feira (14/9), em São Paulo, para lançar a agenda do Congresso da entidade, marcado para outubro, em Campinas (SP).
Durante o encontro com os jornalistas, a Abitrigo reforçou a defesa da chamada convergência regulatória, a equiparação de regras especialmente em matéria de resíduos de produtos químicos no trigo. A entidade participou recentemente de uma discussão sobre o assunto em reunião do Conselho Agropecuário do Sul (CAS).
Os moinhos brasileiros reclamam que, em casos de não-conformidade, são responsabilizados por algo que não são responsáveis. “A análise no Brasil é feita na farinha, no produto final, mas os resíduos são produzidos ao longo da cadeia produtiva. Se os limites são ultrapassados, há efeitos sobre a indústria. Está sendo discutida uma adequação da norma”, argumenta Barbosa.
Desde junho, vigora no Brasil uma regulamentação válida para os países do Mercosul. Prevê que, quando há divergência de normas entre países, o parâmetro a ser seguido em relação ao trigo para exportação é o do país comprador. A garantia do cumprimento da medida no país cabe ao Ministério da Agricultura e à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
O diretor da Abitrigo, Ricardo Tortorella, diz que, até este momento, não foi percebido nenhum efeito prático da medida. Ressalta, no entanto, que o problema dos limites de resíduos de defensivos é preocupante. Segundo ele, há diferenças de normas entre 10% e15% dos princípios ativos aplicados na cultura do trigo entre os países produtores do cereal no Mercosul.
“Quando não há igualdade de critérios, vale o do país importador. E o exportador tem que se ajustar. Queremos evitar problemas através da harmonização de critérios. Existe um problema real e estamos preocupados”, diz ele, sem estimar o quanto de trigo que o Brasil importa vem sendo afetado pela diferenciação de critérios de resíduos.
Fonte: Revista Globo Rural
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