Os impactos econômicos do coronavírus chegaram ao mercado de aluguéis de imóveis, que vem sofrendo principalmente com o fechamento de estabelecimentos comerciais e os efeitos na renda dos trabalhadores informais e autônomos. Administradoras já notaram um aumento na busca por negociação, por parte dos inquilinos, para tentar conseguir descontos e até a suspensão do pagamento nos próximos meses. A recomendação, segundo especialistas, é buscar acordos e evitar a judicialização neste momento.
André Moreira, diretor da Martinelli Imóveis, conta que normalmente os índices de inadimplência nos aluguéis ficam em torno de 10%. A expectativa é que, no próximo mês, esse percentual chegue a 30%.
— Até agora, recebemos duas ligações de inquilinos propondo uma negociação. Um deles é um cliente que não está conseguindo trabalhar e perguntou se existia a possibilidade de suspender a locação agora e pagar depois que a epidemia passar, dividindo o valor nos meses seguintes. O outro tem um comércio de rua e pediu para o locador propor uma solução. Em ambos os casos os proprietários pareceram bastante inclinados a negociar. É um momento bastante delicado, e estamos incentivando os acordos — disse.
Geraldo Victor, gerente-geral de imóveis da Apsa, afirma que a procura por negociações tem sido maior entre os comerciantes, já que a demanda diminuiu nas últimas semanas e, a partir desta terça-feira (dia 24), no município do Rio, os estabelecimentos considerados não essenciais estarão proibidos de abrir.
— A gente insiste muito para que o proprietário negocie, porque ele não vai conseguir outro locatário neste momento. Mas é importante que os dois lados estejam dispostos a ouvir e chegar a um acordo que funcione para todos — ressaltou.
Para Luiz Barreto, presidente da Estasa, porém, o proprietário de imóveis comerciais costuma ter uma margem maior de negociação, o que facilita o acordo.
— Ficamos surpresos porque as pessoas começaram a nos procurar rapidamente. Esperávamos que o comércio ligasse na hora, como academias e restaurantes, mas tivemos uma procura também de locatários residenciais. No caso dos comerciais, a aceitação dos proprietários em relação às negociações foi enorme, em parte porque o investidor de imóveis comerciais é mais empresário, está mais preparado para esses momentos. No caso dos residenciais é mais difícil, há muitos proprietários que dependem daquela renda para viver — explicou.
Apesar disso, Barreto aconselha que os locadores de imóveis residenciais também tentem fechar acordos:
— As corretoras não estão nem mostrando apartamentos por causa do coronavírus. Se o locatário sair, o imóvel vai ficar vazio, e vai ser pior. É possível negociar para que o inquilino pague ao menos o condomínio e o IPTU, e dessa forma o dono não tenha despesas. O governo está adotando uma linha de postergar pagamentos, como FGTS e tributos, e estamos sugerindo que os proprietários façam a mesma coisa.
Economista-chefe da Fecomércio-RJ, João Gomes ressalta que o aluguel representa um custo significativo para o comerciante e que, mesmo com as medidas de auxílio do governo, é importante que se busque postergar os gastos que forem possíveis.
— Os governos têm anunciado medidas de auxílio ao empresariado, como postergação de impostos e concessão de crédito, para deixar o fluxo financeiro o menos prejudicado possível. Mas algumas despesas não têm como ser adiadas, como o pagamento dos funcionários, que o governo ontem anunciou que poderia ser suspenso por quatro meses, mas depois voltou atrás. Então, com relação ao aluguel, é importante buscar uma negociação. Não é uma questão de inadimplência, é um ponto fora da curva — avaliou.
Do ponto de vista legal, Fatima Santoro, coordenadora da pós-graduação de Direito Imobiliário da UVA, afirma que a Lei do Inquilinato prevê que as partes poderão acordar a qualquer momento, sobre o que for necessário.
— A linha de ação mais indicada aqui é o acordo, seja em relação a uma redução do valor ou para postergar o pagamento para daqui a três ou quatro meses, que é quanto tempo essa crise ainda deve durar. Essa situação gerou um efeito dominó, em que todos passam por dificuldades.
O professor de Direito Imobiliário da Escola Superior de Advocacia da OAB-RJ, Fabio Azevedo, aponta que “não existe pelo coronavírus uma autorização abstrata para o calote”. Mas, caso seja provado que o locatário não tinha condições de pagar o aluguel do imóvel residencial ou comercial, em função da pandemia do novo coronavírus, o mais provável é que a Justiça decidisse a favor do inquilino, uma vez que a situação de desequilíbrio financeiro foi gerada por motivo de força maior.
— Contudo, o processo judicial é demorado e, saindo da quarentena, os efeitos da crise ainda serão diluídos por muitos meses, talvez anos. A judicialização só gera mais custos e mais prejuízos para os dois lados. O melhor é buscar uma solução consensual — avaliou Azevedo.
FONTE: EXTRA
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