Parlamentares e representantes religiosos tentam enterrar o texto enquanto defensores querem acentuar o debate
Aprovado pela Câmara em uma votação polêmica e apertada, o projeto de lei que legaliza os jogos de azar no Brasil encontra dificuldades para debate no Senado antes mesmo ser distribuído. Mesmo sem consenso, a proposta — que tramita há mais de 30 anos no Congresso e legisla sobre cassinos, bingos, jogo do bicho e jogos online — começa a ser discutida na próxima terça-feira (8).
Por causa da polêmica, a previsão é de que o PL 442, de 1991, passe por diversas comissões antes de chegar ao Plenário, podendo ser criada uma comissão especial para a discussão. Cabe ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), decidir. Sensível aos pedidos externos de parlamentares religiosos que se manifestam contra a legalização das atividades, há a possibilidade de que o texto vá para a gaveta.
A bancada evangélica faz coro contra a legalização. Dentro do partido de Pacheco, a avaliação é de dificuldade para a aprovação do texto, que requer debate extensivo. Maior bancada do Senado, o MDB deve se posicionar de forma majoritariamente contrária à matéria. A CNBB (da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) também tem se articulado para barrar o debate.
O vice-líder do governo, senador Carlos Viana (MDB-MG), já se manifestou contra. “A experiência internacional mostra que os grandes cassinos são usados para lavagem de dinheiro, tráfico de drogas e prostituição. A fiscalização desse setor é muito difícil”, justificou Viana, ponderando que, apesar da legalização ter potencial de trazer receita ao país, os prejuízos com aumento de gastos com saúde pública e combate ao crime organizado não compensariam.
O líder do Podemos, Alvaro Dias (PR), ainda não confirmou uma orientação de bancada e acredita que um debate extensivo vai tomar os corredores a partir de terça, podendo haver uma articulação capaz de fazer a matéria avançar. Dentro do partido, há, no entanto, senadores que já movimentam os bastidores para barrar a proposta, como é o caso de Eduardo Girão (CE).
“É um assunto extremamente sem sentido nesse momento, uma inversão de prioridades. Estamos vendo o desemprego alto, a fome, inflação e esse projeto não aplaca nada com relação a isso. Acredito que podemos reverter o resultado da Câmara, pois os argumentos contrários são muito consistentes”, defendeu Girão, ao R7, destacando o apoio de entidades de controle e fiscalização do Brasil que apontam a facilitação para o crime organizado.
Sem uma orientação definida da base, ainda que o projeto passe, a expectativa é que seja vetado pelo presidente Jair Bolsonaro. Publicamente, ele tem dito que não legalizará os jogos de azar, mas acredita que o veto pode ser derrubado pelo Congresso. Em contrapartida à negativa, o governo não tem se movimentado para evitar que a proposta ganhe corpo no Senado, aumentando a possibilidade de uma futura aprovação, assim como ocorreu na Câmara.
Em um movimento oposto, o senador Angelo Coronel (PSD-BA) mostra-se como um porta-voz favorável ao tema dentro do Senado e já começa as articulações, inclusive ao lado de Pacheco, colega de partido, na tentativa de destravar o debate. “Vou defender, eu sou favorável à legalização. As potências mundiais, econômicas, com exceção da Indonésia e da Arábia Saudita, que compõem o G20, todas têm os jogos legalizados, assim como os países do Mercosul, com exceção do Brasil. Nós temos que tratar jogos como atividade econômica, não como costume”, argumentou ao R7.
Relator de um projeto com a mesma temática, Angelo quer promover um apensamento de matérias que se debruçam sobre o assunto em um único texto. Ele já se prontificou para ser o articulador oficial da Casa em defesa à legalização dos jogos. “Se for me passada a missão, relatarei sem problema.” A estratégia do parlamentar consiste em mostrar que as atividades já existem e que a legalização gera novas fontes de receita ao Estado, podendo ser revertidas em políticas públicas.
“Se está dando certo, gera emprego e renda para tantos países do mundo, porque nós vamos deixar de auferir essa renda? Nós não estamos inventando o jogo, ele já existe no dia a dia da sociedade brasileira. Só que clandestinamente. Então quem é contra a legalização está sendo favorável a manter a clandestinidade”, disse.
O PSD, no entanto, ainda não tem um posicionamento. “O tema exige debate amplo e aprofundado e vamos nos dedicar a estudar o projeto dentro do PSD”, diz a bancada.
O PL 442, aprovado pela Câmara, prevê a concessão de licenças para várias modalidades de jogos de azar, bem como a legalização de um cassino para cada estado dentro de grandes resorts. Aos entes federados com população entre 15 milhões e 25 milhões de habitantes estão permitidas duas licenças para cassinos e três para estados com mais de 25 milhões de habitantes. O projeto também prevê a exploração de cassinos em embarcações fluviais e uma licença a mais para os estados do Pará e Amazonas devido às dimensões territoriais.
Para os bingos, o limite é de 400 máquinas por estabelecimento, sendo permitida uma casa a cada 150 mil habitantes por município e com capital integralizado de R$ 10 milhões. Estádios também poderão oferecer a modalidade.
O jogo do bicho também fica licenciado, condicionando o número de alvarás ao critério populacional: um para cada 700 mil habitantes. Jogos online podem ser explorados mediante credenciamento junto ao Ministério da Economia.
Em contrapartida, o texto prevê arrecadação tributária decorrente da exploração, criando a Cide-Jogos, com alíquota fixada em 17% para os jogos e a taxa de fiscalização para emissão da licença. A verba será direciona à implementação de políticas públicas, com previsão de repasse aos estados e municípios, à Embratur e aos fundos nacionais de segurança, cultura, financiamento estudantil e destinado à crianças e adolescentes.
FONTE: R7.COM
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