Não é só o futebol brasileiro que sofre nas mãos dos chineses. “Velho Continente” vê compra de clubes, patrocínio de liga, saída de craques e parceria com Jorge Mendes
Pouco mais de 10 horas de voo separam as principais capitais europeias de Pequim ou Xangai. A viagem é bem mais rápida e curta do que aquela que liga o Brasil à Ásia, e a tendência é que o fluxo de boleiros entre os passageiros da Europa à China aumente nos próximos anos. Com o objetivo de conquistar o futebol mundial, os chineses começaram a plantar raízes não só no Brasil, de onde levaram vários jogadores para a Superliga Chinesa, mas voltaram o foco ao futebol do “Velho Continente”.
Campeão brasileiro, o Corinthians, por exemplo, sofreu com as perdas de Ralf, Jadson, Gil e Renato Augusto, mas clubes chineses também atacaram grandes europeus. A mais nova “vítima” foi o Atlético de Madrid. Negociou o atacante colombiano Jackson Martínez por € 42 milhões (R$ 183 milhões), na maior transação da janela do início do ano, superando a ida de Ramires do Chelsea para o Jiangsu Suning. Mas teve também Gervinho saindo do Roma para o Hebei China Fortune, e Guarín do Inter de Milão para o Shanghai Shenhua. E o prazo para transferências por lá só fecha dia 26 de fevereiro.
Fora das quatro linhas, há a entrada como sócios majoritários em equipes ( o Espanyol, por exemplo), parceria comercial com o famoso empresário Jorge Mendes e até o investimento numa liga inteira: a segunda divisão portuguesa passará a ser patrocinada por uma empresa do país asiático.
O plano traçado pelo governo de Xi Jinping engloba capital público e privado. Várias empresas bem-sucedidas de diferentes setores estão investindo no esporte com o aval do governo comunista. Mas para facilitar o acesso ao “Velho Continente”, os chineses escolheram um nome: Jorge Mendes. O empresário de Cristiano Ronaldo, José Mourinho, James Rodriguez, Diego Costa, Dí Maria e tantos outros craques é apontado como um dos homens mais influentes do futebol atual e vai ser o elo entre Europa e China nos próximos anos. O português vendeu uma cota minoritária da sua empresa, a Gestifute, ao Grupo Fosun, do milionário Guo Guangchang, que vai ter suas contrapartidas em breve. O agente luso esteve em Xangai recentemente e levou o treinador e compatriota Mourinho com ele para celebrar a parceria.
– Eles investiram na nossa empresa e agora vamos criar uma estrutura comercial com eles em várias áreas. Temos relações fortes e vamos abrir portas por aqui. É uma colaboração ampla, porque não se trata só de intermediar a negociação de jogadores, mas também tem uma base comercial muito forte. Várias empresas chinesas já investem em Portugal e agora vamos aconselhá-los nos investimentos certos no esporte – explicou Luis Correia, sobrinho e braço-direito de Jorge Mendes na gestão da Gestifute e da Polaris Sports.
O empresário reconheceu, no entanto, que em cima da mesa está também a possibilidade de levar mais jogadores da esfera milionária da Gestifute para o futebol chinês, mas não só. Jorge Mendes vai facilitar o fluxo inverso nos próximos anos.
– Sim, no futuro jogadores nossos podem ir para a China, mas também se trata de dar a possibilidade aos jogadores deles de competirem aqui no futebol europeu. Temos várias estratégias, eles querem melhorar a formação de base e vamos ajudar – definiu Luis Correia.
No passado, Jorge Mendes abriu portas ao empresário e amigo Peter Lim da Singapura no mercado europeu. O agente de Cristiano Ronaldo colaborou na compra do Valencia e recentemente ainda vendeu os direitos de imagem do camisa 7 do Real Madrid ao empresário asiático. Os chineses procuram oportunidades semelhantes, não só com clubes, mas também com ídolos carismáticos que atuam na Europa. Pelo que o GloboEsporte.com apurou, é provável que, além de Mourinho, também Cristiano Ronaldo, Falcao García e outros astros da carteira de Jorge Mendes participem de atividades promocionais na China em seus períodos de férias. A parceria também prevê a abertura de escolas de futebol e transferência de treinadores europeus para o oriente.
EUROPA SE VENDE A CHINESES
Se a Europa tem craques e tradição no futebol, os chineses têm liquidez imediata. A aquisição de clubes e cotas de ações no “Velho Continente” não parece ser a tarefa mais difícil, já que muitos dos clubes estão com a corda no pescoço. O mercado está bem animado nesse setor, o Espanyol foi o mais recente clube europeu a passar para as mãos de chineses. A Rastar Group, liderada pelo milionário Chen Yansheng, pagou € 17 milhões (R$ 74 milhões) por 54% das ações e injetou mais € 33 milhões (R$ 143 milhões) no segundo clube de Barcelona. O objetivo é levar o Espanyol à Liga dos Campeões em três anos.
Em 2015, aquele que é considerado o homem mais rico da China, Wang Jianlin, presidente do Dalian Wanda Group, se converteu em acionista do Atlético de Madrid, pagando € 45 milhões (R$ 195 milhões) por 20% das ações. No mesmo período, o Wanda Group também comprou a empresa suíça Infront, que controla os direitos de transmissões esportivas da Fifa entre 2015 e 2022 (incluindo as Copas do Mundo da Rússia e Catar), além dos direitos do Campeonato Italiano e outros eventos esportivos mundiais.
No ano passado, a notícia de que um consórcio chinês, guiado pelo grupo China Media Capital e pela CITIC Capital, pagou US$ 400 milhões (R$ 1,6 bilhão) por apenas 13% do City Football Group, dono do Manchester City e do New York City FC, surpreendeu, porque os asiáticos pagaram mais por esta pequena cota de ações do que o próprio Sheik Mansour bin Zayed Al Nahyan desembolsou para comprar a totalidade do time em 2008 – 210 milhões de libras (R$ 1,194 bilhão atualmente).
Na Itália, o Milan está, neste momento, negociando a venda de 48% das ações por € 480 milhões (R$ 2 bilhões) com um consórcio tailandês, liderado por Bee Taechaubol, mas do qual fazem parte investidores e bancos chineses. Teachaubol quer botar o Milan na bolsa de Hong Kong. Além das cotas de clubes renomados, os chineses também estão interessados em pequenos times europeus, para onde possam transferir jogadores e treinadores asiáticos mais facilmente. A ideia abordada por Luis Correia da Gestifute vai ser colocada em prática muito em breve em todos os cantos da Europa. O clube da pequena cidade de Pavia, no norte de Itália, passou para as mãos do fundo chinês Pingj Shangai Investment e há notícias de outros investidores chineses atrás de equipes de menor expressão na Itália, Portugal e Espanha.
PORTUGUESES OBRIGADOS A USAR CHINESES
Durante a última semana, a multinacional chinesa, Ledman, anunciou um acordo de patrocínio exclusivo com a Segunda Divisão portuguesa, que passará a se chamar “Ledman Proligue”. O acordo suscitou algumas polêmicas, porque, além de não terem sido divulgados os valores da negociação, ficou estabelecido que os dez melhores clubes da segundona lusa vão receber todos os anos um jogador chinês, e a Liga Portuguesa terá de garantir a sua taxa de utilização. Além disso, auxiliares-técnicos chineses terão que ser utilizados para ganhar experiência.
O acordo foi criticado por muitos comentaristas lusos, que afirmaram que o futebol do país bateu “no fundo”. Mas a preocupação de uns e alegria de outros é que este seja apenas o início das investidas chinesas na Europa.
– Os chineses são ambiciosos. Quando eles querem uma coisa, eles realmente fazem tudo para consegui-la e trabalham muito. O presidente é um grande amante do futebol e tem incentivado esse investimento no esporte. A maioria dos investimentos que estamos vendo é de empresas privadas, mas como a China é um país comunista, o governo tem conhecimento de tudo, controla e com certeza está por trás de muitas destas manobras. Eles querem ser protagonistas no futebol, e como eu conheço os chineses, acho que eles vão conseguir. Eles não vão parar – afirma a jornalista Marzia De Giuli, que trabalhou dois anos na China e é atualmente a correspondente italiana da agência de notícias chinesa Xinhua-Nuova China.
CONTRATAÇÕES MILIONÁRIAS
Com os clubes chineses em pré-temporada e a janela de contratações aberta, o mês de janeiro serviu para os milionários asiáticos mostrarem a sua força no mercado internacional. Os times do país levaram vários destaques do último Brasileirão. Mas o “Velho Continente” protagonizou as principais negociações. Depois de Elkesonprotagonizar a maior transação da do mercado chinês, saindo do pentacampeão nacional Guangzhou Evergrande para o Shangai SIPG por € 18,5 milhões (cerca de R$ 78 milhões), o recorde foi batido duas vezes, a última na segunda-feira passada. Primeiro, Ramires trocou o Chelsea pelo Jiangsu Suning por € 28 milhões (R$ 121,5 milhões). Depois, Jackson Martínez superou a marca, com € 42 milhões (R$ 183 milhões).
O volante colombiano Fredy Guarin, ex-Inter de Milão, também acertou com o Shangai Shenhua. Os italianos receberam € 13 milhões (R$ 56,4 milhões) em troca. O Roma aceitou a proposta do Hebei China Fortune de € 18 milhões (R$ 78 milhões) por Gervinho. E, por muito pouco, Luiz Adriano não trocou o Milan pelo Jiangsu Suning € 15 milhões (R$ 65 milhões), mas a negociação foi por água baixo quando o brasileiro já estava no país asiático para assinar contrato.
A próximo alvo dos chineses seria Alex Teixeira, do Shakhtar Donetsk. Com a negociação para o futebol inglês frustrada por causa dos valores, a ponto de Klopp, técnico do Liverpool, admitir que não podia “jogar esse jogo até o fim”. De acordo com a imprensa italiana, o Guanghzou estaria disposto a desembolsar mais € 50 milhões (R$ 218 milhões) para levar o brasileiro para o time treinado por Luiz Felipe Scolari.
Fonte: globoesporte
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