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Prefeitos têm até o fim do ano para cobrar moradores por coleta de lixo

Lei estabelece que gestores não devem comprometer orçamento municipal para subsidiar a prestação do serviço aos cidadãos

As pessoas não se dão conta de que a coleta de lixo domiciliar tem um alto custo para as prefeituras. Em São Paulo, por exemplo, o gasto anual é de R$ 2,2 bilhões. De acordo com o artigo 35 da Lei Federal nº 14.026, as cidades que ainda não realizam arrecadação de recursos para a gestão de resíduos sólidos devem apresentar soluções para custear o serviço, uma delas é a cobrança aos moradores. O prazo é até o fim do ano.

Se for estabelecida uma taxa, com a prestação do serviço pela própria prefeitura, o projeto precisa antes da aprovação pela Câmara de Vereadores. Já no caso da tarifa gerada pela concessão do serviço, o trâmite não é necessário.

“Ainda não se encerrou o ano de 2021 para estar com os projetos aprovados. A gente espera a virada do ano para começar a fazer essa espécie de auditoria. Verificar quais municípios que efetivamente instituíram a arrecadação e se ela cumpre o que está na lei, no sentido de ser integral, e ver os que não conseguiram ainda, para ver quais punições previstas pela lei”, explica Leonardo Matheus da Silva, economista do Sulerb (Sindicato Nacional das Empresas de Limpeza Urbana).

As prefeituras serão penalizadas caso não adotem a cobrança pelo serviço. Os gestores podem responder por crime de renúncia de receita por impactar o orçamento municipal.

Para o secretário nacional de Saneamento, Pedro Maranhão, as prefeituras não devem subsidiar a coleta e o manejo do lixo.

“O município não pode pagar para tirar da minha porta o lixo. Eu tenho que pagar por ele. Aqueles que não podem pagar, tem a tarifa social, que está prevista em todas as planilhas de custo das empresas que ganham a concessão. Não tem cabimento a cidade de São Paulo dotar cerca de R$ 200 milhões por mês. Esse dinheiro tem que ir para creches, saúde e mobilidade”, justificou.

Especialistas do setor defendem que o serviço seja concedido à iniciativa privada, com cobrança de tarifa ao consumidor. Hoje a coleta e o descarte de lixo estão sob a responsabilidade da prefeitura, que usa a verba do orçamento municipal para prestação do serviço. Os moradores sequer sabem a destinação do lixo ou quanto pagam por ele – o que, de certa forma, incentiva o desperdício.

Cidade de São Paulo

A maior metrópole do país não cobra os moradores pela coleta de lixo. Mas, em 2003, a Taxa de Resíduos Sólidos Domiciliares passou a ser praticada na gestão de Marta Suplicy (PT). A cobrança foi feita até 2005 e, segundo o levantamento do Selurb, foi responsável por diminuir 10% da geração de resíduos em relação aos anos anteriores. No entanto, com o fim da taxa, os moradores voltaram a produzir mais lixo.

O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), afirmou que não deve instituir a ecotaxa novamente na cidade. Ele conta com uma receita extraordinária para custear o serviço, sem que os cidadãos tenham que pagar.

Segundo a legislação, “o titular do serviço deverá obrigatoriamente demonstrar a sustentabilidade econômico-financeira da prestação dos serviços ao longo dos estudos que subsidiaram a contratação e deverá comprovar, no respectivo processo administrativo, a existência de recursos suficientes para o pagamento dos valores incorridos na delegação, por meio da demonstração de fluxo histórico e projeção futura de recursos.”

Nunes está contando com o pagamento da União pelo uso de lotes no aeroporto Campo de Marte, na zona norte da capital. A Aeronaútica utiliza o espaço desde a década de 1950, mas não paga ao município. A dívida foi estimada em R$ 25 bilhões pela administração municipal.

“É muito provável que não enviaremos para a Câmara Municipal essa taxa porque estamos avançando na negociação com o governo federal para fazer a troca da dívida da questão da ação do Campo de Marte. Com isso a gente teria recursos para poder subsidiar os resíduos sólidos”, revelou o prefeito.

Se o pagamento for, de fato, acertado, o recurso será utilizado para custear a coleta e tratamento do lixo na capital paulista pelos próximos anos, sem que seja necessária a criação de uma taxa.

A cidade de São Paulo coleta, diariamente, 10 mil toneladas de resíduos e tem 16 mil agentes de limpeza, sendo que 5 mil atuam na coleta de lixo. São 17 mil quilômetros de vias públicas e praças. São três aterros sanitários, duas centrais de processamento de resíduos de saúde, duas centrais de triagem de recicláveis e 120 ecopontos.

Taxa é polêmica

A cobrança pela prestação do serviço é impopular. Os moradores alegam que já estão sobrecarregados de impostos e boletos, ainda mais agora com a crise da pandemia de covid-19. Por isso, o principal entrave à implementação da cobrança é o capital político.

“Há um hall grande de carga tributária no país, mas que é mal distribuída. Muitas cobranças que não são vinculadas acabam entrando no caixa geral da prefeitura e são utilizadas para pagamentos de outros serviços, não para aqueles que a taxa foi proposta. O capital político de quem vai instituir uma nova cobrança, ele acaba sendo visto negativamente, haja vista a Marta [Suplicy] que virou Martaxa”, revela o economista da Selurb.

Os especialistas acreditam também que, ao cobrar pelo serviço, existe maior transparência com relação ao custo da coleta dos resíduos, da destinação correta do lixo, do tratamento dado, onde o dinheiro é aplicado, sem falar nos ganhos ambientais, com a extinção dos lixões a céu aberto.

Estudo do Selurb

Um estudo recente feito pelo Selurb revelou que a cobrança pelo serviço de coleta urbana contribui para uma redução de 8% na geração de resíduos per capita. Isto equivale a cerca de um mês sem geração de lixo ao ano ou um ano a menos de geração de resíduos a cada 12 anos.

A economia representa aproximadamente 10.200 piscinas olímpicas ou quase metade do estádio do Maracanã (Rio) em volume de lixo.

Estudos demonstraram que a cobrança é importante para viabilizar o tratamento e a destinação correta dos resíduos sólidos, além de incentivar a redução da geração de lixo.

Entre as principais variáveis que explicam a grande geração de resíduos estão o crescimento econômico e a taxa de urbanização. Onde a renda é maior, o consumo também é, o que aumenta a geração de resíduos.

Os dados usados no estudo são do SNIS (Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento) 2019, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas) e do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira). Eles abrangem 3.712 cidades ou 66% dos municípios brasileiros. Do total, apenas 1.662 realizam a cobrança pelos serviços, sendo que só 109 recuperam integralmente os custos.

“A grande maioria dos municípios faz a cobrança parcial. Pouquíssimos conseguem fazer frente à despesa total. Isto significa que a prefeitura complementa o valor pago pelo serviço. A maioria ainda na forma de taxa. Quem adotou a concessão, não necessita de subsídio”, afirma o economista.

Com a obrigatoriedade da cobrança, o Selurb espera uma redução ainda maior na geração de resíduos no país.

“Assim que se consolidar a cobrança de forma universalizada, vai aumentar ainda mais a redução de lixo per capita. A cobrança atua direto nesse aspecto. É importante que haja conscientização ambiental, mas o impacto mais imediato é com a economia comportamental, quando se paga pelo lixo que gera”, destaca Leonardo Matheus.

Desigualdades regionais

A região sul do Brasil reúne a maioria das cidades que já adotam a cobrança, seguida pelo sudeste. No centro-oeste ainda são poucas as iniciativas e no norte e nordeste do país, quase não se vê o pagamento pela coleta e os resíduos são depositados em lixões.

Segundo o Islu (Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana), 58% dos municípios ainda não estabeleceram uma fonte de arrecadação específica para custear a atividade. Os menores são os que enfrentam mais adversidades por falta de recursos. Uma das opções é a união com as demais cidades do entorno para criação de uma proposta regionalizada ou um consórcio para prestação do serviço.

O levantamento indica que quanto maior a implementação da cobrança, melhor é o índice de reciclagem e de destinação correta do lixo.

Um estudo da Ernest & Young mostrou que, com o pagamento pelo serviço, o consumidor passa a gerar menos lixo. É o conceito do poluidor-pagador.

Entre os estados, Santa Catarina é o modelo a ser seguido. Hoje não há mais lixões em atividade e o serviço foi concedido à iniciativa privada. A primeira concessão no Brasil com cobrança direta de tarifa foi em Balneário Camboriú, em 1999.

Concessão em Santa Catarina

A concessionária Ambiental SC presta o serviço de coleta e destinação de resíduos e emite carnês aos moradores. A empresa tem seis contratos de concessão. Cada um deles tem uma base de cálculo, que é determinada pelo município. O valor mensal médio é R$ 24,52.

Segundo Cesar Ávila, que é gerente comercial da Ambiental Limpeza Urbana e Saneamento, os moradores aprovam a concessão. “Além do valor mensal da tarifa ser acessível, a população reconhece a pontualidade e a qualidade dos serviços. Esses aspectos contribuem para o pagamento das tarifas com pouca resistência. Podemos observar que o valor é muito inferior ao de outros serviços públicos prestados por concessionárias e de utilities”, ressalta.

A concessão inclui quatro coletas por semana, sendo três de resíduos domiciliares e uma de recicláveis (coleta seletiva). O lixo é levado para aterros sanitários licenciados, que atendem aos padrões estabelecidos pelos órgãos de controle ambiental.

“Em Balneário Camboriú, em apenas 2 anos, já possibilitou dobrar o volume de recicláveis coletados. O contrato ainda possibilita que a concessionária faça investimentos a curto prazo, diluindo os valores durante o prazo contratual, o que permite melhorias, como a instalação de ecopontos para as pessoas depositarem os resíduos de forma separada, contentores subterrâneos e PEV (Pontos de Entrega Voluntária)”, afirma Cesar Ávila.

Uma pesquisa do Ipespe (Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas) contratada pelo Selurb, realizada em abril, revelou que, em Joinville, onde há cobrança pelo serviço, os moradores estão satisfeitos com a limpeza urbana, a classificaram como ótima a boa, e consideraram o pagamento justo. O levantamento faz uma comparação com as cidades de São Paulo e Goiânia, que não cobram pela coleta.

No caso de Santa Catarina, não há isenção de tarifa para as famílias de baixa renda. Segundo a concessionária, há apenas a cobrança de um valor menor em determinadas regiões da cidade.

FONTE: R7.COM

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